quarta-feira, 4 de maio de 2011

Resposta a um irmão que pede esclarecimentos sobre os castigos divinos


Anônimo disse...
Vcs me desculpem, mas eu acho que os dois estão perdendo tempo em uma discussão desnecessária.
Eu sei que existe o Inferno, que existem sofrimentos por conta do pecado, todavia, eu acredito que o Inferno, os sofrimentos por conta do pecado, o fim do Sodoma e Gomorra, não estão dentro dos desejos de Deus, pelo menos, não de forma direta. São ocasionados pela incapacidade dos homens de viverem como filho de Deus. Então, não seriam castigos, mas sim, consequencias de escolhas equivocadas. Creio que talvez nossos amigos deste apostolado possam esclarecer esse ponto... Não creio que sejam castigos, mas aconteceram e acontecem como preço a se pagar por uma vida que se deseja sem Deus, sem ordem, como se o homem fosse capaz de gerar seu próprio destino de forma independente. Peço que esclareçam para mim. Obrigado e espero uma resposta.

Prezado irmão, Salve Maria!

Achei seu comentário muito educado e muito pertinente, apesar de haver uma série de equívocos que merecem reparos. Todavia, entendo que você tem dúvidas e essas dúvidas serão respondidas educadamente, afinal, não vi qualquer hostilidade ou orgulho em suas palavras que me levassem a comportar-me como um “domador”.

Primeiramente digo que nunca uma discussão e uma repreensão são desnecessárias. Já dizia o Papa São Félix:

“Não combater o erro é corroborar com ele. Não defender a verdade é suprimi-la”

Portanto, todos os que hostilizam contra a doutrina da Igreja serão sim duramente repreendidos pela nossa equipe de apostolado, sendo que a dureza da repreensão será diretamente proporcional ao grau de orgulho e estupidez dos que nos escrevem. Como disse Albert Einstein, o grande gênio da física moderna, “Duas coisas são infinitas: O universo e a estupidez humana. Mas, no que respeita ao universo, ainda não adquiri a certeza absoluta. Minha única queixa quanto à seu comentário é o anonimato. Quem fala no anonimato pode falar o que quer, tira de si as responsabilidades de sua fala e, portanto, perde a razão. Não há motivos para que uma pessoa tão educada como você se mantenha oculto.

A Palavra de Deus deixa bem claro, e é preciso muita má vontade para negar, que há sim castigos e vinganças provenientes de Deus. Veja por exemplo as palavras claras da Sagrada Escritura Eclo 39, 34; Is 63, 3; Is 63, 6; Jr 4, 26; Ex 20, 5; Lv 26, 25; Nm 14, 34; Ap 6, 10; Hb 10, 30. Esses castigos e essas vinganças não retratam a ira no sentido de pecado capital, mas sim no sentido das infinitas sabedoria e bondade de Deus. Vemos, por exemplo, que Deus castigou os infiéis filisteus que abriram guerra contra o povo sagrado (I Sm 17, 45-57). Deus castigou Davi (II Sm 12, 1-23) quando este mandou Urias para a morte (II Sm 11, 1-27). Entretanto, vemos também que com nosso arrependimento, Deus perdoa nossos pecados e nos faz nascer a nova graça (II Sm 12, 24-31). Isso deixa claro que Deus é misericórdia, pois mesmo após um castigo, Ele está sempre pronto para nos perdoar e nos acolher. O livro de Jonas deixa claro que mesmo após os erros de Nínive e de Jonas, Deus perdoou e amou a todos, pois eles se arrependeram de suas faltas. Aí está a chave, Deus só perdoa quem pede perdão e só se pede perdão legítimo quando se tem arrependimento. Veja que Jesus sempre disse aos pecadores, vá e não peques mais, ou seja, eu te perdôo, mas não torne a pecar.

Meu caro, se Deus ama, mas não castiga, que tipo de amor é esse? São Tomás de Aquino diz que quem ama quer o bem, e quem quer o bem não corrobora como a maldade, repreendendo-a muitas vezes (Lv 19, 17; Sm 118, 21, Pr 19, 25). Assim, esse mesmo Santo fala sobre o bem absoluto e o bem relativo. O bem relativo é qualquer bem, exceto Deus. O dinheiro é um bem relativo, pois pode ser bom ou mau. Deus, porém, nunca pode ser mau, pois Deus é o bem no grau máximo, o bem que é bom em todos os sentidos. Ora, como sendo o bem máximo, Deus não quer que o pecador morra, mas viva, e a vida em abundância só existe perto de Deus. O pai que ama o filho não poupa a vara (Pr 13, 24). Quem castiga os filhos são os pais, que os amam, e não os vizinhos, que não se importam com os filhos dos outros. Assim, para que o filho ande na retidão, Deus por bem também o castiga.

É bom, entretanto, dizer que nem sempre os sofrimentos e as dificuldades vêm como castigo. Por exemplo, se um homem se embriaga e depois dirigindo bêbado morre em um acidente, Deus está isento desse fato, que partiu do livre arbítrio. Caso bem diferente pode ocorrer se um filho desobediente à Deus tem o “azar” de trombar com esse bêbado e sofrer uma grave lesão. Essa lesão pode levá-lo a recorrer a Deus, o bem absoluto. Todavia, nem sempre um acidente tem esse sentido e devemos ser cautelosos ao afirmar que algo é ou não castigo divino. Santo Agostinho diz que além da vontade de Deus, há sempre o livre arbítrio, a vontade do homem.

Não pense, pois, que são só os infiéis que passam por dificuldades, pois essas vêm para todos (Mt 5, 45). Os fiéis podem passar por dificuldades por castigo, escolha, purificação, provação ou por um acaso qualquer. O livro de Jó narra que Jó era um servo fiel e Deus permitiu que ele fosse provado. As almas do purgatório, por exemplo, para se purificarem tem um sofrimento comparável ao do inferno. A escolha interfere também no sofrimento. Deus, em sua infinita sabedoria criou o mundo de tal forma que todos os pecados dos homens tivessem conseqüências. Por isso São Paulo diz que o salário do pecado é a morte (Rm 6, 23; veja também Gl 6,8). É por causa, não da ira enquanto pecado capital, mas da ira enquanto sabedoria de Deus que temos o salário do pecado, para que pensemos nas conseqüências de nossos atos e vivamos segundo a vontade divina. Há ainda que se ver os sofrimentos que simplesmente acontecem, como por exemplo, as doenças genéticas. Jesus disse que elas vêm para que a glória de Deus se manifeste (Jo 9, 1-3).

Faço também um reparo no seu pensamento, fruto talvez de um relativismo desregrado que tem entrado na Igreja. Dizer que Deus não age como um educador é tirar Deus desse mundo. O modernismo e o relativismo querem trazer o homem para o centro, retirando Deus de toda ação e conseqüência ocorrida. Isso é uma falácia. Assim, o livro The Secret dá a Deus o caráter de uma energia, força superior, o que é falso. Deus é um ser inteligente, com vontade própria e com capacidade de interferir no mundo sim e não foram raras as vezes em que Ele fez isso. Leia, por exemplo, o Milagre do Sol que se deu por ocasião da Aparição de Nossa Senhora em Fátima.

Cuidado com o modernismo, porque ele tem trazido consigo uma secularização dos fiéis. A cada dia mais vemos as pessoas perdendo a dimensão espiritual da fé, que é o mais importante. As pessoas têm vivido como se Deus não existisse, mesmo na Igreja Católica. Por isso, tome cuidado com o que você ouve dos padres, Lutero também era padre. O ensinamento do clero só é válido se estiver em concordância com o que ensina a doutrina da Igreja.

No que se refere ao sofrimento do Inferno, é bom ter em mente alguns pontos. Primeiramente ninguém vai pro Inferno porque Deus quer. Uma vez no Inferno, a alma não pode mais sair, pois as almas do inferno estão lá por consentimento pleno de querer ir pra lá. A doutrina da Igreja prega que uma vez descarnada, a alma não está mais submetida ao espaço e ao tempo. Ora, isso dá a alma uma noção plena (ciência plena) de seus atos e das conseqüências deles. Assim, a irmã Clara narra (veja aqui) o julgamento de sua amiga Anita, que estando no Inferno enviou uma carta para contar como tudo ocorre.

As almas descarnadas quando frente a frente com Deus recebem o julgamento particular. Através disso, as almas vêem toda sua vida passar diante de seus olhos e vêem também as conseqüências dos atos delas. Vendo tudo isso, as almas podem arrepender-se ou não e isso é o que decide se uma alma vai ou não para o Inferno. Esse arrependimento se dá por amor a Deus. Nesse lagar, o fogo e as penas impostas pelos demônios são os menores problemas. Há vários outros sofrimentos, como pensar nos erros cometidos nessa terra e pensar na perda da salvação. A pior de todas as penas de uma alma infernal é se ver abandonada por Deus por toda a eternidade. Anita, no Manuscrito do Inferno diz que até para essas almas Deus é misericordioso. Há almas que chegam à um estado tal de pecado que não mais são capazes de se arrepender. Quando Deus percebe isso, ele tira delas a vida, para que não continuem pecando e para que esses pecados não as torturem ainda mais no Inferno, pois uma das torturas é a lembrança dos pecados cometidos nessa vida.

As almas do Inferno são tão duras que só sabem blasfemar e odiar o Altíssimo. Não há volta para elas porque as almas têm consciência plena, logo, não é pela dureza do coração de Deus, mas sim pelo orgulho das almas infernais que elas permanecem lá eternamente. No Purgatório, muito embora haja um sofrimento comparável ao do Inferno, as almas um dia sairão de lá para o paraíso, que é a comunhão plena com Deus. Você pode ler mais sobre isso no livro “O Purgatório: O que a Igreja ensina?” – Professor Felipe Aquino.

Portanto, vemos através dessa carta que Deus castiga sim, mas que nem todo sofrimento é castigo de Deus. Isso não significa que Deus não ama, muito pelo contrário. Como diz a sabedoria popular, Quem não procura Deus pelo amor, procura pela dor.

Vejo o sofrimento como sendo algo necessário para repensarmos nossas atitudes e nossas vidas. Através dele nos purificamos e nos tornamos mais perfeitos. Talvez se vivêssemos na bonança, nunca nos lembraríamos de Deus e nos tornaríamos seres orgulhosos, incapazes de amar.

O fato de haver sofrimento no mundo não significa que Deus é injusto. Eu pensaria isso se houvesse apenas essa vida, mas eu sei que por maior que seja a alegria desse mundo, o que nos aguarda do outro lado é muito maior que o que temos aqui. Por isso eu sei que Deus nos ama e que a justiça de Deus, embora se manifeste também nessa terra, eleva o homem à plenitude da vida somente após a morte. Portanto, mesmo com todas as adversidades nessa terra, a vida vindoura me leva a crer que Deus é amor.

In Caritas Christi
Eduardo Moreira.