terça-feira, 30 de novembro de 2010

Apostolado SCR recebe o selo prêmio Sunshine Award



Nosso humilde blog foi escolhido para receber em reconhecimento de nosso trabalho "O Selo Prêmio Sunshine Award", que representa a confirmação da introdução do blog Apostolado SCR no “roll” dos melhores Blogs do Brasil.

Fomos indicados pela irmã Taiana Froes do blog “Temas polêmicos da Igreja Católica” (http://temaspolemicosigreja.blogspot.com/) excelente blog que recomendo.

Felicitações Taiana fico feliz com sua grande contribuição ao reconhecimento de nosso blog.

Aos Que recebem o selo devem seguir algumas regrinhas:

1 - Criar um artigo sobre o prêmio.

2 - criar um link do blog que o indicou.

3 - Indicar 12 blogs para o Sunshine Awards (não tem problema indicar para alguém que já recebeu)

4 - Informar aos indicados sobre o prêmio.

Minhas 12 Indicações para receber o selo, são:

http://contra-o-aborto.blogspot.com/

http://subsidioliturgico.blogspot.com/

http://nostraelaetitiae.blogspot.com/

http://culturadavida.blogspot.com/

http://sentircomaigreja.blogspot.com/

http://www.veritatis.com.br/inicio/blog

http://www.missaocefas.org/

http://blog.cancaonova.com/felipeaquino/

http://www.deuslovult.org/

http://blog.cancaonova.com/dominusvobiscum/

http://diasimdiatambem.wordpress.com/

http://www.acarajeconservador.blogspot.com/

domingo, 28 de novembro de 2010

O que disse o Papa sobre os preservativos?

O novo livro de Bento XVI, "Luz do Mundo: o Papa, a Igreja e os Sinais dos Tempos", nem sequer tinha sido publicado e já estava no centro de uma controvérsia nos meios de comunicação on-line.

A polêmica explodiu na semana passada, quando o L'Osservatore Romano violou unilateralmente o embargo sobre o livro, publicando alguns extratos em língua italiana das diversas declarações do Papa, para grande desgosto dos editores em todo o mundo, que trabalhavam cuidadosamente visando um lançamento orquestrado do livro, que se daria na terça-feira seguinte.

Um dos extratos tratava do uso de preservativos para tentar evitar a propagação da AIDS e a imprensa imediatamente tirou proveito disto (p.ex.: Reuters, Associated Press, BBC Online). E assim, surgiram manchetes como:

- Papa diz que os preservativos são admissíveis em certos casos para deter a AIDS

- Papa: "Os preservativos justificam-se em alguns casos"

- Papa diz que os preservativos podem ser usados na luta contra a AIDS

Particularmente notória é a declaração de William Crawley, da BBC:

"O Papa Bento XVI parece ter alterado a postura oficial do Vaticano sobre o uso de preservativos, adotando uma posição moral que muitos teólogos católicos já recomendavam há muito tempo".

Bah!

Pois bem: em primeiro lugar, trata-se de um livro de entrevistas. O Papa foi entrevistado. Não estava exercendo seu múnus oficial de ensinar. Este livro não é uma encíclica, uma constituição apostólica, uma bula papal, nem nada semelhante. Não é uma publicação da Igreja. Trata-se de uma entrevista realizada por um jornalista, em idioma alemão. Conseqüentemente, o livro não representa um ato do Magistério da Igreja, nem tem a capacidade de "alterar a postura oficial do Vaticano" em nada. Não possui força dogmática nem canônica. O livro - que é fascinante e sem precedentes, mas isto é tema para outra oportunidade - constitui aquilo que se classifica como opiniões pessoais do Papa sobre as perguntas questionadas pelo entrevistador Peter Seewald.

E como o Papa Bento XVI observa no livro:

"Há que se dizer que o Papa pode ter opiniões privadas que se encontram equivocadas".

Não estou assinalando isto para insinuar que naquilo que o Papa Bento XVI fala a respeito dos preservativos está incorreto - chegaremos a este ponto ao seu tempo - mas para indicar o contexto da situação, deixando claro que se trata das opiniões privadas do Papa. São apenas isto: opiniões privadas. Não é ensino oficial da Igreja. Então, continuemos...

Entre os desserviços do L'Osservatore Romano feitos para romper o embargo do livro da maneira que fez, houve também o fato de que apenas publicou um pequeno trecho da seção em que o Papa discutia sobre o uso dos preservativos. Como resultado, o leitor não tinha como ver o contexto das suas declarações e, assim, garantir que a imprensa secular não estava tomando as observações do Papa fora do seu contexto (o que seria feito de qualquer modo, mas talvez nem tanto). Especialmente notório é o fato de que o L'Osservatore Romano omitiu o material onde Bento esclarece sua declaração sobre os preservativos, em uma pergunta logo a seguir.

Com efeito, o L'Osservatore Romano causou um grande dano tanto às comunidades católicas quanto às não-católicas.

Felizmente, agora você pode ler o texto completo das declarações do Papa.

Ademais, prevendo a controvérsia que estas palavras poderiam produzir, a drª. Janet Smith preparou um guia útil sobre o que o Papa disse e não disse.

Lancemos vista aos comentários do Papa, para ver o que ele realmente disse.

"Seewald: (...) Na África, se apontou que o ensino tradicional da Igreja demonstrou ser a única maneira segura de se deter a propagação do HIV. Os críticos, incluindo a crítica dentro das próprias fileiras da Igreja, objetam que é uma loucura proibir a população de alto risco de usar preservativos.

Bento XVI: (...) Em minha intervenção, eu não estava fazendo uma declaração geral sobre o tema do preservativo, mas apenas dizendo - e isto é o que causou grande ofensa -, que não podemos resolver o problema mediante a distribuição de preservativos. Resta muito o que fazer. Devemos estar próximos das pessoas; devemos guiá-los e ajudá-los; e temos que fazer isto antes e depois do contágio com a doença. É um fato, como você já sabe, que as pessoas podem obter preservativos quando o desejarem, de qualquer modo. Porém, isto serve apenas para demonstrar que os preservativos por si próprios não resolvem o problema em si mesmo. Muito mais precisa ser feito. Enquanto isso, no âmbito secular, desenvolveu-se a teoria chamada 'ABC' - abstinência, fidelidade, preservativo -, em que se entende o preservativo somente como um último recurso, quando os outros dois pontos foram rejeitados. Isto quer dizer que concentrar-se no preservativo implica em uma banalização da sexualidade, e, além de tudo, é precisamente a origem perigosa da atitude da sexualidade, não como a expressão do amor, mas como uma espécie de entorpecente que as pessoas administram a si mesmas. Esta é a razão pela qual a luta contra a banalização da sexualidade é parte também da luta para garantir que a sexualidade seja tratada como um valor positivo e para que possa ter um efeito positivo na totalidade de ser do homem".

Consideremos que o argumento geral do Papa é que os preservativos não resolvem o problema da AIDS. Em apoio disto, ele aponta vários argumentos:

1) As pessoas já podem obter preservativos, mas é evidente que o problema não foi resolvido.

2) No mundo secular foi proposto o 'Programa ABC', em que o preservativo só será usado quando os dois primeiros procedimentos verdadeiramente eficazes - a abstinência e a fidelidade - tiverem sido rejeitados. Assim, a proposta secular do ABC reconhece inclusive que os preservativos não são a única solução. Eles não funcionam tão bem quanto a abstinência e a fidelidade. Os dois primeiros são melhores.

3) Concentrar-se no uso do preservativo representa uma banalização (trivialização) da sexualidade, que se converte de ato de amor em ato de egoísmo. Para que o sexo desempenhe o papel positivo que deve ter, esta banalização do sexo - e, portanto, a fixação nos preservativos - deve ser resistida.

Esse é o contexto da afirmação que a imprensa reproduziu:

"Pode haver casos individuais justificados como, por exemplo, quanto um prostituto usa um preservativo, e isto pode ser um primeiro passo para uma moralização, um primeiro ato de responsabilidade para desenvolver novamente a consciência de que nem tudo é permitido e que não se pode fazer tudo o que se quer. Porém, não é realmente a maneira de tratar com o mal da infecção pelo HIV, o que realmente pode apenas vir de uma humanização da sexualidade".

Há várias coisas a se considerar: em primeiro lugar, leve em conta que o Papa diz que: "Pode haver casos individuais justificados", e não que: "Está justificado". Esta é uma linguagem especulativa. Mas sobre o quê o Papa especula? Que o uso do preservativo está moralmente justificado? Não, não foi isso o que ele disse, mas que pode haver casos "sempre e quando [o uso do preservativo] pode ser um primeiro passo para uma moralização, um primeiro ato de responsabilidade para desenvolver novamente a consciência de que nem tudo é permitido".

Em outras palavras, como diz Janet Smith:

"O Santo Padre está simplesmente observando que para alguns prostitutos homossexuais o uso de um preservativo pode indicar um despertar do sentido moral, um despertar acerca de que o prazer sexual não é o valor máximo, mas que devemos ter o cuidado de não prejudicar ninguém em nossas escolhas. Ele não está falando de uma moralidade do uso de preservativos, mas de algo que pode ser certo sobre o estado psicológico daqueles que os usam. Se estas pessoas, usando preservativos, o fazem com o fim de evitar prejudicar outras, com o passar do tempo perceberão que os atos sexuais entre membros do mesmo sexo são intrinsecamente maus, já que não estão de acordo com a natureza humana".

Pelo menos isto é o máximo que se pode razoavelmente inferir das declarações do Papa, o que poderia ser expresso com maior clareza (e espero que o Vaticano emita um esclarecimento urgente).

Em segundo lugar, repare que o Papa segue imediatamente sua declaração acerca da prostituição homossexual usuária de preservativos com a afirmação: "Porém, não é realmente a maneira de se tratar com o mal da infecção pelo HIV, o que realmente pode apenas vir de uma humanização da sexualidade".

Por "uma humanização da sexualidade", o Papa quer reconhecer a verdade sobre a sexualidade humana, que deve ser exercida de maneira amorosa, fiel entre um homem e uma mulher unidos em matrimônio. Esta é a verdadeira solução e não colocar um preservativo e manter relações sexuais promíscuas com pessoas infectadas com um vírus mortal.

Neste momento da entrevista, Seewald faz uma pergunta de continuidade, e é verdadeiramente um crime que o L'Osservatore Romana não tenha reproduzido esta parte:

"Seewald: Quer dizer, então, que a Igreja Católica, na realidade, não se opõe em princípio ao uso dos preservativos?

Bento XVI: Ela, obviamente, não os considera como solução real ou moral, porém, neste ou em outro caso, pode haver, todavia, a intenção de reduzir o risco da infecção, como um primeiro passo para uma forma distinta e mais humana de viver a sexualidade".

Assim, Bento XVI reitera que esta não é uma solução real (prática) para a crise da AIDS, nem tampouco uma solução moral. No entanto, em alguns casos, o uso de preservativo mostra "a intenção de reduzir o risco da infecção", que é "um primeiro passo para... uma forma mais humana de viver a sexualidade".

Portanto, não está dizendo que o uso de preservativos é justificado, mas que pode mostrar uma intenção particular e que esta intenção é um passo na direção correta.

Janet Smith oferece uma analogia útil:

"Se alguém fosse assaltar um banco e estava decidido em empregar uma arma de fogo, seria melhor para essa pessoa usar uma arma desmuniciada: reduzir-se-ia o risco de lesões mortais. Porém, não é tarefa da Igreja ensinar possíveis assaltantes de banco a assaltar bancos de uma maneira mais segura; menos ainda é tarefa da Igreja apoiar programas para oferecer a possíveis assaltantes de banco armas de fogo incapazes de ser municiadas. Não obstante, a intenção de um assaltante de banco em assaltar um banco de uma maneira que é mais segura para os funcionários e clientes do banco pode indicar um elemento de responsabilidade moral que poderia ser um passo para a compreensão final da imoralidade que é o assalto a bancos".

Muito mais se poderia dizer de tudo isto, mas pelo que vimos, já resta claro que as declarações do Papa devem ser lidas com cuidado e que não constituem o tipo de licença para o uso de preservativos que os meios de comunicação desejam.

Há mais por vir...

Fonte:

AKIN. James. O que disse o Papa sobre os preservativos? [Tradução de Carlos Martins Nabeto]. Apostolado Veritatis Splendor. Disponivel em: http://www.veritatis.com.br/doutrina/a-igreja/955-o-que-disse-o-papa-sobre-os-preservativos Acesso em 29 outubro 2010.

quarta-feira, 17 de novembro de 2010

A questão do Filioque

Um ponto nevrálgico:

Em síntese: As relações entre cristãos gregos e latinos se tornaram tensas por um motivo teológico: o Espírito Santo procede do Pai e do Filho? (posição latina) ou procede do Pai pelo Filho? (posição grega). A controvérsia se tornou candente nos séculos IX-XI, levando ao cisma bizantino de 1054, cisma que até hoje perdura, embora as conversações dos teólogos de parte a parte estejam contribuindo para aproximar entre si os irmãos. No fundo, pode-se dizer que a controvérsia é mais lingüistica do que propriamente teológica: gregos e latinos não entendem do mesmo modo o vocábulo "proceder".

Dando continuidade ao artigo anterior, voltamos-nos explicitamente para a controvérsia do Filioque, tida pelos gregos como motivo de cisma em 1054. Na verdade, o Evangelho afirma que o Espírito Santo procede do Pai (cf. Jo 15, 26); o Credo niceno-constantinopolitano (381) repetiu esta profissão de fé. Todavia os latinos acrescentaram ao Credo a partícula Filioque, professando que o Espírito procede do Pai e do Filho. Isto deu origem a calorosa controvérsia, pois os cristãos orientais se puseram a acusar os ocidentais de haver alterado o Símbolo da Fé.

A seguir, examinaremos o desenrolar dos acontecimentos desde o início e a atual posição da Igreja.

O Problema Lingüístico

A doutrina segundo a qual o Espírito Santo procede do Pai, está no Evangelho de S. João: "...o Espírito da verdade, que procede (ekporeúetai) do Pai" (15,26).

A Escritura também se refere à relação do Espírito com o Filho, quando Jesus diz: "Receberá do que é meu e vô-lo anunciará" (Jo 16,14s) ou ainda: "Quando vier o Paráclito, que vos enviarei de junto do Pai" (Jo 15,26).

Estes dizeres levaram alguns Padres gregos a afirmar que o Espírito Santo é "do Pai e do Filho". Assim S. Cirilo de Alexandria (+444):

"O Espírito é o Espírito de Deus Pai e, ao mesmo tempo, Espírito do Filho, saindo substancialmente de ambos simultaneamente, isto é, derramado pelo Pai a partir do Filho" (De adoratione, livro I, PG 68,148).

S. João Damasceno (+749) professava:

"O Espírito Santo provém das duas Pessoas simultaneamente" (De recta fide 21, PG 76,1408).

S. Epifânio de Salamina (+403) escrevia:

"É preciso crer, a respeito de Cristo, que Ele vem do Pai, é Deus proveniente de Deus, e, a respeito do Espírito, que Ele provém do Cristo, ou, melhor; de ambos, pois Cristo disse: '...Ele procede do Pai' e 'receberá do meu'" (Ancoratus 67).

"Já que o Pai chama Filho o que procede do Pai e Espírito Santo o que provém de ambos,... fica sabendo que o Espírito Santo é a luz que vem do Pai e do Filho" (Ancoratus 71).

Dídimo de Alexandria (+398) professava, comentando palavras de Jesus:

"Ele não falará sem mim e sem a decisão do Pai, porque Ele não tem origem em si, mas é do Pai e de mim. Pois o que Ele é como subsistência e como palavra, Ele o é pelo Pai e por mim" (De Spiritu Sancto 34).

Deve-se observar que tais autores admitem, de certo modo, a origem do Espírito Santo a partir do Pai e do Filho, mas não dizem que o Espírito procede do Filho. Segundo esses escritores, o Espírito procede do Pai pelo Filho ou ainda provém do Filho, mas não procede do Filho. Acontece, porém, que, para os latinos, a tradução do verbo ekporeúetai, proceder, não tinha exatamente o mesmo sentido que para os gregos. Para estes, ekporeúetai significava procedência a partir de um Princípio absoluto, não procedente, não gerado, como somente é o Pai; o Filho é um Principio gerado, do qual, por conseguinte, não se pode dizer que dele procede (ekporeúetai) o Espírito Santo.[1]

Já que os latinos traduziam ekporeúesthai por procedere, entendido como "derivar-se de, originar-se de, provir de ...", aplicaram o verbo latino para designar a relação do Filho com o Espírito Santo[2]. Ora isto ofendeu os gregos, que fizeram deste gesto a ocasião de candente litígio até hoje não plenamente resolvido.

O desenrolar dos acontecimentos vai, a seguir, apresentado.

As etapas da controvérsia

A profissão de fé mais antiga que menciona a proveniência do Espírito a partir do Pai e do Filho é um Credo atribuído a S. Dâmaso Papa (366-384)[3]. Outras profissões de fé dos séculos IV-VI incluem o Filioque, geralmente na Espanha, onde estava difundida a concepção do Filioque.

Compreende-se então que alguns Concílios regionais de Toledo tenham feito idêntica declaração. Foi o que se deu em 447, 633, 638...

Muito mais importante e ousada foi a inserção do Filioque no Credo niceno-constantinopolitano. Os Concílios da Espanha adotaram esta medida no intuito de mais difundir tal crença. O primeiro testemunho de tal inserção data de 589: o Concílio de Toledo III recitou o símbolo da fé com o Filioque, e pronunciou o anátema sobre quem recusasse crer que o Espírito Santo procede do Pai e do Filho; os conciliares, por quanto se depreende das atas do Concílio, julgavam que tal doutrina já fora professada por Nicéia I e Constantinopla I. - A inserção do Filioque no símbolo foi igualmente professada pelos Concílios regionais de Toledo VIII (653), XII (681), XIII (683), XIV (688), XVII (694), como também pelo 4º Concilio regional de Braga (675) e pelo de Mérida (666).

Enquanto isto acontecia, alguns teólogos rejeitavam o acréscimo do Filioque ao símbolo. A sé de Roma ou os Papas aceitavam a doutrina do Filioque, mas não favoreciam a inserção feita no Credo; repetidamente rejeitaram instâncias de cristãos sinceros que pediam à Santa Sé o reconhecimento e a oficialização do Filioque no símbolo de fé. Tinham consciência de que tal gesto podia melindrar os gregos, que, por razões culturais, lingüisticas e políticas, se distanciavam aos poucos da Sé de Roma (desejosos de fazer de Constantinopla a Nova Roma). Por conseguinte, nos séculos VI/VIII os Papas se abstinham de falar do Filioque na sua profissão de fé.

Da península ibérica a profissão do Filioque passou para o reino dos francos. Como atestam os Livros Carolinos, redigidos em 794 por ordem de Carlos Magno, tal uso era comum no território franco. A propagação deste costume era, em grande parte, movida pelo desejo de afastar qualquer heresia que restaurasse o adopcionismo ou o subordinacionismo. Em 809 o Filioque era cantado na capela de Carlos Magno.

No séc. VIII deu-se ainda o caso dos monges latinos de Jerusalém. Com efeito; Carlos Magno estava em boas relações com o Califa Haroum-al-Raschid, senhor da Terra Santa; em conseqüência o califa outorgou ao rei dos francos uma certa soberania sobre Jerusalém. Havia monges latinos estabelecidos no monte das Oliveiras, que seguiam suas Regras como eram vigentes no país franco e, por isto, cantavam o Filioque no Credo. Quando certo dia os monges gregos os depreenderam observando este costume ocidental, acusaram-nos de heresia e os agrediram, considerando-os bárbaros. Os monges latinos então apelaram para o Papa Leão III. Este houve por bem escrever uma encíclica, que ele enviou aos monges francos de Jerusalém, dizendo-lhes:

"Nós vos enviamos este símbolo de fé ortodoxa, para que vós, assim como o mundo inteiro, guardeis inviolavelmente a fé segundo a profissão da Igreja Romana Católica e Apostólica".

O Papa acrescenta por duas vezes que o Espírito procede do Pai e do Filho, e termina afirmando que este artigo pertence à íntegra da fé católica.

Leão III enviou a Carlos Magno a carta dos monges de Jerusalém, já que estes contavam com a tutela do monarca. O Imperador então reuniu um sínodo em Aquisgrano (809), que reafirmou a doutrina do Filioque e cujas atas foram enviadas ao Papa mediante delegados. O Papa recebeu estes emissários; mostrou-se plenamente de acordo com as conclusões do Concílio de Aquisgrano fundamentadas na tradição latina, mas não quis consentir na inserção do Filioque no Credo, mantendo assim a posição de seus antecessores. Eis o trecho final do diálogo de Leão III com os legados francos:

"Legados: Cantar o Credo sem o Filioque não dará aos fiéis a ocasião de crer que tal palavra foi condenada? Que remédio podemos dar a isto?

O Papa: Se de antemão me tivessem consultado sobre o acréscimo, eu o teria proibido. Eis agora o expediente que me aflora à mente: pouco a pouco no palácio imperial deixai de cantar o Filioque no símbolo de fé; dai como razão para isto o fato de que não é cantado na Santa lgreja Romana. Quando tiverdes cessado de o fazer; todos também cessarão. Desta maneira os fiéis guardarão o que tiverem aprendido, e desaparecerá um canto ilícito sem escândalo para a fé".

Esta declaração revela bem a prudência da Santa Sé, que, apesar de tudo, não conseguiu convencer os francos, levando-os à obediência, e queria evitar novos choques com os gregos. Para evitar, frente a estes, qualquer mal-entendido, Leão III mandou gravar sobre duas placas de prata o mesmo texto do Credo Niceno-Constantinopolitano em grego e em latim e quis que fossem afixadas na confissão (altar-mor) de São Pedro como testemunho de comunhão de fé entre o Oriente e o Ocidente.

A pressão dos cristãos ocidentais continuou a se exercer sobre a Santa Sé, que resistiu até o século XI. Em 1013, porém, o Imperador Henrique II (1002-1024) instou, mais uma vez, junto ao Papa Bento VIII (1012-1024) para que inserisse o Filioque no canto do Credo em Roma; o Pontífice anuiu ao pedido em 1014, ficando assim os latinos unânimes na observância de tal praxe.

No século IX, o Patriarca Fócio de Constantinopla levantou de novo a questão acusando os latinos de ser "transgressores da Palavra de Deus, corruptores da doutrina de Jesus Cristo, dos Apóstolos e dos Padres; seriam novos Judas a dilacerar os membros de Cristo". O Patriarca era movido não somente por zelo religioso, mas também por ambição política, já que desejava exaltar a nova Roma em detrimento da primeira. Redigiu uma carta encíclica aos Patriarcas e Arcebispos do Oriente, em que abordava questões discutidas, inclusive a do Filioque, e chegou a escrever:

"O símbolo de fé diz somente que o Espírito Santo procede do Pai. Por conseguinte o símbolo afirma que o Espírito Santo procede do Pai somente".

Como se vê, Fócio usa uma dialética vazia, que peca contra as regras da Lógica, maltratando o advérbio somente.

Em 867, Fócio reuniu em Constantinopla um Concílio anti-romano, pouco freqüentado.

Depois de Fócio, a situação se acalmou até o Patriarca Sísimo, de Constantinopla, que em 995 renovou os ataques aos latinos. As suas invectivas chegaram ao termo final sob o Patriarca Miguel Cerulário, quando em 1054 se deu a ruptura, até hoje existente, entre gregos e latinos.

De então por diante o Filioque foi sendo abertamente professado pelos Papas e pelos Concílios do Ocidente. Com efeito, em 1098 um Concílio em Bari (Itália) travou um debate com os gregos, professando o Credo ampliado. Em 1215 o Concílio do Latrão IV professou a processão do Espírito a partir do Pai e do Filho na sua exposição dogmática Firmiter credimus. Em 1274 o Concílio de Lião II condenou com anátema os que negavam tal artigo.

Ao afirmar que o Espírito procede do Pai e do Filho, os latinos não quiseram negar a fórmula grega "... do Pai pelo Filho"; elas se conciliam entre si, pois que o Pai gera o Filho dando-lhe a peculiaridade de ser Princípio do qual procede o Espírito Santo (está claro que isto não implica prioridade de dignidade ou de tempo para o Pai em relação ao Filho e ao Espírito Santo).

A teologia escolástica medieval latina, seguindo as pegadas de Santo Agostinho (+430), prova que o Espírito Santo procede do Filho, pois, se assim não fosse, não se distinguiria do Filho. Com efeito, em Deus há uma só essência ou divindade, na qual só pode haver distinção onde há oposição relativa; ora, para que o Espírito se distinga do Filho, tem que se lhe opor como o termo de processão se opõe ao ponto de partida da processão.

A atual posição da Igreja Católica

A Igreja Católica continua a professar o Filioque em sua Liturgia e em suas diversas declarações, mas não impõe aos orientais a sua inserção no Credo.

Assim já no Concílio de Lião II (1274) o Papa Gregório X pediu aos gregos que reconhecessem a verdade dogmática do Filioque, mas não os obrigou a cantar o símbolo da fé com esse acréscimo. Mesmo assim os gregos presentes a tal Concílio cantaram o símbolo com a partícula controvertida.

Também no Concílio geral de Florença, o Papa Eugênio IV (1431-1447) não obrigou os gregos a cantar o Credo ampliado. Da mesma forma Clemente VIII (1592-1605) não exigiu que os rutenos uniatas[4] cantassem o Filioque, desde que o aceitassem como artigo de fé. Mais importante ainda é a bula Etsi Pastoralis de Bento XIV, promulgada em 1742, que reza explícita e definitivamente:

"Embora os gregos tenham a obrigação de crer que o Espírito Santo procede também do Filho, não são obrigados a professá-lo no símbolo".

Esta regra está vigente até nossos dias.

Em 1995 deu-se um acontecimento significativo: o Patriarca Bartolomeu I, de Constantinopla, esteve reunido com o Papa João Paulo II aos 29/06 na basílica de São Pedro em Roma, ocasião em que o Papa pediu ao Pontifício Conselho para a Unidade dos Cristãos que esclarecesse a questão do Filioque, a fim de facilitar o bom relacionamento com os orientais. Desse pedido resultou um longo texto assinado aos 08/09/1995, do qual extraímos a seguinte passagem, que reafirma quanto foi dito na Lição 1 deste Módulo:

"Apresentamos aqui o sentido doutrinal autêntico do Filioque na base da fé trinitária professada pelo Concílio Ecumênico de Constantinopla. Damos esta interpretação abalizada, conscientes da pobreza da linguagem humana para exprimir o inefável mistério da SS. Trindade...

A Igreja Católica interpreta o Filioque referindo-o à sentença normativa e irrevogável do Concilio Ecumênico de Constantinopla em seu símbolo... Na base da tradição teológica latina anterior, alguns Padres do Ocidente, como S. Hilário, S. Ambrósio, S. Agostinho e S. Leão Magno, haviam professado que o Espírito Santo procede (procedit) eternamente do Pai e do Filho.[5]

Como a Biblia latina (a Vulgata e as traduções latinas anteriores) tinha traduzido Jo 15,26 (parà tou Patrós ekporeúetal) por 'qui a Patre procedit', os latinos traduziram o ék tou Patrós ekporeuómenon do Símbolo niceno-constatinopolitano por 'ex Patre procedentem'. Assim foi criada uma falsa equivalência a propósito da origem do Espírito Santo entre a teologia oriental da 'ekpóreusís' e a teologia latina da 'processio'.

A 'ekpóreusis' grega significa apenas a relação de origem do Espírito frente ao Pai tão somente, Pai que é o Princípio sem princípio da Trindade. Ao contrário, a 'processio' latina é um termo mais amplo que significa a comunicação da divindade consubstancial do Pai ao Filho e do Pai, com e pelo Filho, ao Espírito Santo. Confessando o Espírito Santo 'ex Patre procedentem', os latinos supunham um 'Filioque' implícito, que seria explicitado mais tarde na sua versão litúrgica do Credo" (Ver La Documentation Catholique, 5/11/1995, p. 942).

Esta explicação, como dito, não é senão a que propusemos em nosso primeiro subtítulo pp. 120s. - Reduz o problema a um mal-entendido lingüístico. É para desejar que encontre acolhida entre os nossos irmãos orientais.

Notas:

[1] Quando se fala do Pai como princípio absoluto, não se tenciona dizer que o Filho é relativo ou é inferior ao Pai. Em Deus não há maior ou menor nem anterior ou posterior.

[2] Do verbo latino faz-se 'processão', vocábulo da Teologia Sistemática, que difere de 'procissão'.

[3] Há quem diga que a prioridade toca a S. Ambrósio de Milão (+397).

[4] Rutenos são os cristãos dependentes da antiga metrópole Kiev (Ucrânia), que após o cisma se uniram à Santa Sé pelo tratado de Brest-Litovak (25/12/1595). São ditos "uniatas" porque se uniram a Roma.

[5] S. Hilário de Poitiers (+367) escreve: "A quem julga que há diferença entre receber do Filho (Jo 16,15) e proceder (procedere) do Pai (Jo 15,26), respondemos que é certo que é uma só e mesma coisa receber do Filho e receber do Pai" (De Trinitate VIII 20). É neste sentido da comunicação da Divindade pela processão que S. Ambrósio de Milão formula o Filioque: "O Espírito Santo, quando procede (procedit) do Pai e do Filho, não se separa do Pai nem se separa do Filho" (De Spiritu Sancto 1,11,120). Desenvolvendo a teologia do Filioque, S. Agostinho quis salvaguardar a monarquia do Pai no seio da comunhão consubstancial da Trindade: "O Espírito Santo procede do Pai a título de princípio (principaliter), e, pelo dom intemporal do Pai ao Filho, procede do Pai e do Filho em comunhão (communiter)" (De Trinitate XV 25,47). Ver S. Leão Magno, sermões LXXV, 3 e LXXVi, 2.
Fonte:

Pe. Estêvão Bettecourt. Revista Pergunte e Responderemos 442 - pp. 120-126. Apostolado Veritatis Splendor. Disponível em: http://veritatis.com.br/apologetica/deus-uno-trino/951-a-questao-do-filioque Acesso em: 17 Outubro 2010.

segunda-feira, 8 de novembro de 2010

Proibidos de casar ou castos por opção?

Um dos argumentos protestantes mais usados contra o celibato é que ele seria algo imposto, que os sacerdotes, religiosas etc., seriam proibidos de se casar e – portanto, alegam – o celibato seria antibíblico. Num fórum de discussão, um protestante alegou: “Paulo não era casado, por opção dele ...e não porque era proibido. no catolicismo è proibido”

Será isso verdade? Ou isso não passaria de mais um sofisma protestante? Por acaso o protestante supracitado sabe o que vem a ser o celibato evangélico, como proposto por S. Paulo e por Cristo? Parece que não. Inclusive, se soubesse, saberia que nos ritos orientais os sacerdotes podem ser ordenados se forem casados. Se acaso não se ordenam casados, serão celibatários dali em diante. Afinal, Nosso Senhor pede que a todos quantos o forem seguir que nada podemos amar mais que Ele, seja pai, mãe ou esposa/marido (Mt 10, 37-38).

O primeiro a propor o celibato, veja que coisa, foi Jesus! Sim, é isso mesmo: foi Cristo quem propôs pela primeira vez o celibato. Veja as palavras de N. Senhor:

"Respondeu ele: Nem todos são capazes de compreender o sentido desta palavra, mas somente aqueles a quem foi dado. Porque há eunucos que o são desde o ventre de suas mães, há eunucos tornados tais pelas mãos dos homens e há eunucos que a si mesmos se fizeram eunucos por amor do Reino dos céus. Quem puder compreender, compreenda." (S. Mateus 19, 11 e 12)

Então, Jesus fala aí que muitos se fazem eunucos por amor ao Reino dos Céus. Uma coisa importante: o texto fala em 3 tipos de eunucos. O primeiro seria os que “são desde o ventre” de suas mães, são pessoas que nascem com alguma disfunção que lhes tolhe a função sexual. O segundo tipo falado por Cristo são os que foram tornados eunucos “pela mão dos homens”, ou seja, eram pessoas castradas, que eram feitas assim para vigiar haréns, fazer tarefas domésticas ou servir como espiões e por fim há os que são descritos por Cristo, como pessoas que a “si mesmo se fizeram eunucos”, por amor ao Reino. O que isso significa?

Quando Cristo fala de SE FAZEREM eunucos pelo Reino, Ele evoca o celibato, pois embora eles não sejam fisicamente eunucos, eles abrem mão do prazer sexual e - consequentemente - do casamento, já que o sexo fora do casamento não é permitido na moral cristã. Se fazer eunuco – portanto – é a mesma coisa que falar de celibato: renunciar ao casamento e ao sexo, por consequência.

Depois, São Paulo fala a mesma coisa com outras palavras, veja:

"Pois quereria que todos fossem como eu; mas cada um tem de Deus um dom particular: uns este, outros aquele. Aos solteiros e às viúvas, digo que lhes é bom se permanecerem assim, como eu. Mas, se não podem guardar a continência, casem-se. É melhor casar do que abrasar-se." (1Coríntios 7,7-9)

Ele começa o capítulo 7 falando de como os casados devem proceder (versículos 2 a 6) e aí emenda algo que ele tinha só feito menção no início do capítulo:

"Agora, a respeito das coisas que me escrevestes. Penso que seria bom ao homem não tocar mulher alguma." (1Coríntios 7,1)

Ele fez menção breve como vc viu, no começo do capítulo e foi para como os casados devem proceder. Aí ele fala que gostaria que todos fossem como ele (Paulo era celibatário), mas ele reconhece ser um dom de Deus tanto um - o celibato - como o outro (casamento). Ao falar dos solteiros e das viúvas, ele os encoraja fortemente a viverem a castidade e a manterem-se celibatários: " Aos solteiros... é bom se permanecerem assim". E ainda fala que ele também o faz ("como eu"). Mas, logo ele adverte, que se não conseguir guardar a continência sexual, que se case, pois é "melhor casar que abrasar-se", segundo o próprio S. Paulo.

São Paulo ainda explica o motivo de ele recomendar expressa e vivamente o celibato:

“Quisera ver-vos livres de toda preocupação. O solteiro cuida das coisas que são do Senhor, de como agradar ao Senhor. O casado preocupa-se com as coisas do mundo, procurando agradar à sua esposa. A mesma diferença existe com a mulher solteira ou a virgem. Aquela que não é casada cuida das coisas do Senhor, para ser santa no corpo e no espírito; mas a casada cuida das coisas do mundo, procurando agradar ao marido” (1 Coríntíos 7, 32-34)

Então, aí está o motivo pelo qual S. Paulo recomendava vivamente o celibato: o solteiro, o celibatário e a virgem estão livres para dedicar-se de modo integral ao Reino de Deus enquanto os casados tem outras preocupações: o marido ou a mulher, filhos, etc. E é por esse mesmo motivo que a Igreja pede que os sacerdotes, religiosos e religiosas sejam celibatários: para serem livres para servirem a Deus. Afinal, eles não terão outra preocupação além do Reino. E quando se abraça a vida sacerdotal ou religiosa, supõe-se que a pessoa em questão o faz para servir a Deus, dedicar-se ao Seu serviço. Nada mais coerente, então, que essa pessoa abdique de coisas santas e lícitas (o casamento, por ex.) para que ela possa ter dedicação total ao seu chamado.

Veja, então, que isso é - ao contrário do que muitos pensam - um dom de Deus. Não é para todos, claro, o próprio S. Paulo o reconhece. E não é - como o protestante citado afirma - uma imposição, antes a vocação sacerdotal ou religiosa é uma opção e uma opção consciente. Aliás, a bem da verdade, não só a vida sacerdotal e religiosa são celibatárias, mas muitos leigos o são celibatários por opção também. Desfazendo, assim, a suposta oposição entre o que diz S. Paulo e o que a Igreja faz. Na verdade, como vimos, a Igreja nada mais faz do que obedecer a São Paulo. Mas a bem da verdade as pessoas que são contrárias ao celibato deveriam ter esses fatores acima citados em mente. Ou correm o sério risco de faltar com a verdade dos fatos.

Fonte:

Veritatis Splendor: (http://veritatis.com.br/)