quinta-feira, 30 de junho de 2011

Sequelas da Heresia.


Por. John Lennon J. da Silva

É quase que habitual aos católicos bons de “percepção” como diria o teólogo norte-americano Scott Rahn. Se defrontarem com a proclamação ou propagação de falsas doutrinas recheadas de heresias, ao ligar a televisão ou em conversas informais com não católicos e também na internet. Parece comum lermos ou escutarmos especulações ditas “teológicas” vindas de diversos grupos, movimentos e comunidades sejam protestantes ou não. Estes acontecimentos, digamos que corriqueiros têm encontrado enorme repercussão em nossos dias. Oriundas das sequelas deixadas pelas grandes heresias; a última delas historicamente remonta os tempos da Reforma Protestante do fim do século XVI.

O termo “heresias” provém etimologicamente do latim haerĕsis. Versado do grego αἵρεσις, [escolha, partido ou opção]. Existem várias designações para o que é heresia. Podemos enfim aludir a heresia “como desvio, equivoco e erro teológico oposto a ortodoxia¹ cristã, contrariando aos dogmas e preceitos da Igreja Católica, e que pode ter como centralidade a deturpação, má interpretação e propagação de falsa doutrina não alinhada a sã doutrina como deixada pelos apóstolos e mantida pelos cristãos antigos”.

O Catecismo com uma linguagem mais prática e objetiva diz que “Chama-se heresia a negação pertinaz, após a recepção do Batismo, de qualquer verdade que se deve crer com fé divina e católica, ou dúvida pertinaz a respeito dessa verdade” (CIC 2089).

O adjetivo “heresia” aparece em citação de São Paulo aos Coríntios; “É necessário que entre vós haja partidos para que possam manifestar-se os que são realmente virtuosos” (I Cor 11,19). Originalmente a palavra “partido” em algumas traduções é versada para o termo “heresias”. O Apostolo Paulo Também enumerara entre as obras da carne a; “idolatria, superstição, inimizades, brigas, ciúmes, ódio, ambição, discórdias, partidos²” (Gl 5,20).

As heresias sempre estiveram presentes ao longo dos séculos dentre o Cristianismo, consequentemente todas repelidas pela autoridade da Igreja Católica através de concílios êcumenicos e erforço de Papas, Bispos e teológos. Lembremos os vários movimentos que foram condenados por seus equivôcos, erros e pela promungação de falsas doutrinas como gnosticos, donatistas, arianos e outros. Sem esquecer os pseudo-movimentos encabeçados pelos Valdenses, Albigenses, Anabatistas e Reformadores Protestantes.

Já no I século levantavam-se homens que deturpavam a pregação apostolica e os evangelhos. Ensinavam e pronunciavam doutrinas não ortodoxas, por isto S. Paulo alertava “se alguém pregar doutrina diferente da que recebestes, seja ele excomungado!” (Gl 1,9) constituía umas das primeiras medidas disciplinares da Igreja primitiva. Aos indivíduos que desviavam-se da pregação dos Apóstolos, tarefa mais tarde que será brilhantemente guardada pelos Padres Apostólicos em especial chamo a atenção S. Irineu de Lião.

"Suponhamos que se levante uma questão sobre algum importante ponto entre nós, e não possamos recorrer às mais primitivas comunidades com as quais os apóstolos mantiveram constante relacionamento, as quais aprenderam deles o que é certo e claro a respeito dessa questão. O que aconteceria se os próprios apóstolos não nos tivessem deixado escritos? Não seria necessário (nesse caso) seguir o curso da tradição que transmitiram àqueles aos quais entregaram às Igrejas?" (Irineu de Lião. Contra as Heresias III,4,1).

Ainda nos tempos apostólicos, João o Teólogo como é chamado no Oriente, o autor do quarto evangelho, exorta biblicamente “Se alguém vier a vós sem trazer esta doutrina, não o recebais em vossa casa, nem o saudeis” (II Jo 1,10) era mais uma atitude pastoral. Na antiguidade cristã, muitos falsos profetas e homens (cf. Jud 1,10-11); afastaram-se da Igreja, separavam-se da comunhão com as primeiras comunidades e fundavam partidos e difundiam suas ideias em algumas regiões causando conflitos com as Igrejas locais, por isto é memorável as palavras de S. João Evangelista “Eles saíram dentre nós, mas não eram dos nossos. Se tivessem sido dos nossos, ficariam certamente conosco. Mas isto se dá para que se conheça que nem todos são dos nossos.” I Jo 2,19.

Os padres da Igreja mantiveram papéis essenciais na condenação de vários erros teológicos e heresias durante os VII primeiros séculos da Igreja, por intermédio dos concílios e da autoridade dos primeiros bispos de Roma. Desta forma lembra o historiador francês Geoges Duby “todo herético tornou-se tal por decisão das autoridades ortodoxas.” (DUBY, 1990, p. 177). Mesmo nestas condições as seitas como eram consideradas as correntes que mantinham estas posições, não coerentes com a doutrina católica penduravam-se e desenvolviam-se por longas décadas de forma isolada até que se extinguissem ou não. E outras seitas surgissem; a convivência com as heresias era estreita e vetada, versando as condições religiosas e jurídicas da época. No séc. XIII Tomás de Aquino exortava aos fieis católicos que não mantivessem relações algumas com os hereges, nem mesmo conversas para que não se corrompessem tomando com citação (I Co 15,33).

Atualmente verifica-se que as comunidades eclesiais surgidas da Reforma comungam das doutrinas heréticas dos primeiros reformadores como o heresiarca³ Martinho Lutero no séc. XVI. E ainda mais o neo pentecostalismo têm manifestado outros modismos teológicos nas novas “igrejas”, cercados comumente de aversão aos ensinamentos católicos e alguns outros fenômenos do anticatolicismo. Para enumerarmos existem hoje muitas crenças heréticas como a não consciência dos que já faleceram, o batismo pelos mortos, o milenarismo, o Espirito Santo desprovido de Divindade e etc. Além das crenças originadas na Reforma a solo fides, solo graça, solo escritura, livre exame e assim vai...

Interessante e que em nossos tempos estas doutrinas tem encontrado acessibilidade junto às pessoas como que em um rodízio, existem crenças e “igrejas” para todos os gostos e como é necessidade moderna a “novidade” esta se encontra em alta atualmente. Muitos tem se entregado as sagazes e falaciosas novidades “abandonando a lei santa que lhes foi ensinada” (II Pd 2,21). O Apostolo Pedro profetizou sobre as heresias, dizendo que “Muitos os seguirão nas suas desordens e serão deste modo a causa de o caminho da verdade ser caluniado” (II Pd 2,2). E como é difícil para os bons católicos hoje cercados de adversidades manterem-se intactos e ortodoxos; apegados a verdade revelada a Igreja “Coluna e sustentáculo da verdade” (II Tm 3,15); perante as atuais e corriqueiras consequências trágicas, reflexo das heresias como salientei no início do artigo. Que tornam os verdadeiros cristãos os personagens caluniados, injuriados e os vilões dos últimos séculos.

Notas:

Ortodoxia¹: Adjetivo povém do grego "orthós" (retos) e "dóxa", (opinião). Resultando na tradução “crença correta” como salientam alguns linguistas.

Partidos²: O termo corresponde a “heresias” como aparente em algumas versões da bíblia. Cf. I Cor 11, 19:

Heresiarca³: Significa mentor, iniciador ao melhor “pai” de uma doutrina ou pensamento herético, o termo pode ser endendido e usado para designar um chefe ou cabeça de uma seita herética.

Referencias;

DUBY, Georges. Heresias e Sociedades na Europa Pré-Industrial, séculos XI-XVIII in Idade Média – Idade dos Homens. São Paulo: Companhia das Letras, 1990. p.175-184 [original: 1988].

IRINEU DE LIÃO. Contra as Heresias III. 4,1.

sábado, 25 de junho de 2011

Os Jesuítas na América latina

História da presença jesuítica na América latina.


Por. Prof. Carlos Ramalhete

Introdução

Para o brasileiro médio de hoje, é dificílimo sequer imaginar o ambiente mental dos europeus, especialmente íberos, do século XVI. Tudo, na concepção do homem da época, passava pela religião. Não havia sequer a possibilidade mental de imaginar o mundo de maneira materialista ou secular.

Isto não era, entretanto, como hoje em dia é comum acusar, um totalitarismo religioso imposto sobre a população. A religião regrava as vidas não por imposição externa, mas por crença real e livremente aceita. As autoridades religiosas não detinham senão uma parcela ínfima do poder que hoje tem qualquer guarda de trânsito. As autoridades civis no nível nacional espanhol e português estavam apenas começando a ter o seu poder aumentado lentamente, às custas do poder tradicionalmente mantido pelas instâncias inferiores. Mesmo assim, o poder dos reis era infinitamente menor que o poder exercido por um prefeito moderno. Um rei não poderia dizer a uma Universidade o que fazer, o que ensinar, quem contratar e a quem admitir como aluno. Um rei não poderia dizer a um pai de família como e onde educar seus filhos.

Toda a sociedade estava organizada tendo como pólo principal não as leis e regulamentações estatais, mas a religião. Ao contrário de hoje, havia um acordo completo dentro de todos os segmentos da sociedade, até mesmo os criminosos, acerca do que era certo e do que era errado, do que era permissível e do que não era. Os criminosos não viam com orgulho seus atos criminosos, como hoje muitos fazem; os atos desonestos que cometiam eram por eles vistos como atos desonestos e não justificáveis.

Ao mesmo tempo surgia mais ao norte a sombra da Era Moderna; com a Revolta protestante, seguida pelo dito "Iluminismo", a era de ouro da civilização européia cedia o lugar aos primeiros sinais do que viria a tornar-se a barbárie genocida do século XX. Na Espanha e em Portugal, contudo, a longa batalha, finalmente concluída, contra as tropas muçulmanas instaurava um período de grandeza espiritual e material. O Século de Ouro espanhol se iniciava.

No mesmo ano em que Cristóvão Colombo descobriu a América, foi concluída a Retomada. A Península Ibérica, que passara oitocentos anos sob dominação muçulmana, estava finalmente de volta às mãos dos cristãos. A longa guerra pelo domínio da Península fizera com que a mentalidade espanhola e portuguesa fosse radicalmente diferente da mentalidade do resto da Europa. Enquanto para a maioria dos europeus o mundo era a Cristandade, para os ibéricos a lembrança recente dos duros combates contra os muçulmanos, e até a presença de muçulmanos nos territórios recém-retomados, eram fatores importantes na formação da mentalidade do povo. Os íberos eram povos guerreiros, povos de soldados.

Estes soldados, entretanto, eram profundamente religiosos. Em suas guerras eles cometiam crimes hediondos, como aliás o fazem quase todos os soldados. Raramente, porém, encontraríamos alguém que os quisesse justificar. A noção de “guerra total”, não podemos esquecer, é uma invenção do século XX.

Os Jesuítas

A Societas Jesu, ou Companhia de Jesus, foi fundada em 27.IX.1540 pelo ex-militar espanhol Santo Inácio de Loyola. Um de seus primeiros seguidores foi o jovem São Francisco Xavier. Organizada em moldes militares, era dedicada à obediência à Igreja ao ponto de adicionar um quarto voto, de obediência direta ao Papa, aos tradicionais votos de pobreza, obediência e castidade. Dispensando muitas práticas tradicionais em prol de uma maior mobilidade, a Companhia de Jesus foi a primeira congregação regular a não ter hábito próprio, não ter canto comum dos Horas litúrgicas e não ter eleições internas, adotando um regime monárquico baseado na obediência. O superior Geral da Companhia é chamado "Papa Negro" (por usar a batina negra dos padres diocesanos), e só presta obediência ao Papa. Do mesmo modo, os jesuítas (termo originalmente ofensivo mas depois adotado pelos membros da Companhia) só prestavam obediência ao Papa e a seus superiores dentro da Companhia. Eles também não faziam votos solenes, de modo a poderem ser mais facilmente dispensados pelo Papa em caso de necessidade.

Antes mesmo do reconhecimento canônico da Companhia, seus membros já foram encarregados pelos Papas de várias missões difíceis, especialmente a luta contra as heresias dentro da Cristandade e a evangelização de povos distantes e agressivos. Coube aos jesuítas a evangelização do Japão, da China (onde envolveram-se em uma questão controversa por adotarem uma versão achinesada da liturgia), da Índia, da América do Norte (onde tombaram vários, martirizados pelos índios na Flórida, em Nova Iorque, na Virgínia e no Canadá). A eles também couberam as tentativas de re-catolicização da Inglaterra, onde vários foram martirizados pelos protestantes. A Companhia teve ao todo mais de oitocentos de seus membros martirizados in odium fidei.

Por adotarem intransigentemente a defesa da Fé e a obediência ao Romano Pontífice, muitas foram as inimizades conquistadas pelos Jesuítas. Os protestantes, os jansenistas, os iluministas, os traficantes de escravos; todos, em um ou outro momento, levantaram-se contra estas vozes da pura Fé, que preferiam entregar sua vida a ceder na defesa da verdade.

A questão ética

Quando foram descobertas as novas terras das Américas, os Reis de Espanha e Portugal receberam permissão papal para evangelizar estes territórios. Os soldados que haviam sido enviados, porém, por mais religiosos que fossem, não eram de modo algum a elite moral da sociedade ibérica. Eram bandidos anistiados, eram aventureiros em busca de fortuna, eram, em suma, a escória da sociedade.

Dois foram os modos de exploração econômica e evangelização das novas terras. Portugal manteve-se na costa, buscando primordialmente o comércio com as tribos nativas. A Espanha, que encontrou quase imediatamente grandes impérios, procurou dominá-los e submetê-los à Coroa. O raciocínio que foi empregado para justificar esta dominação era multiforme. Por um lado, os nativos deveriam ser evangelizados, o que fazia com que fosse necessário manter uma presença forte na terra nova para garantir a segurança dos missionários. Por outro, os nativos tinham hábitos que provocavam nos espanhóis uma justa indignação, como o sacrifício humano. Assim, fazia-se necessário intervir violentamente para fazer cessar estes sacrifícios, que atingiam a casa das dezenas de milhares de pessoas por ano. Ao mesmo tempo, a cobiça dos soldados fazia com que estas razões, que por si seriam justas em algumas circunstâncias, fossem freqüentemente invocadas sem razão.

O Rei da Espanha estabeleceu então um sistema de comendas, que deveria assegurar ao mesmo tempo os interesses financeiros dos espanhóis e o bem-estar dos índios. Os índios seriam empregados pelos espanhóis, a força se preciso fosse, mas sendo sempre pagos, alimentados e educados por seus patrões. A escravização deles não seria permitida. Em breve, porém, os supostos “empregos” tornaram-se mais e mais semelhantes a condições de real escravidão, o que provocou a justa indignação do Bispo de Chiapas, D. Bartolomeu de Las Casas, OP, que chegou a excomungar os maus patrões.

A questão do modo como estavam sendo tratados os índios chegou então às Universidades espanholas, centro do pensamento moral e teológico da época. Vivas questões foram suscitadas acerca do tratamento dado aos índios. Os professores que eram ligados à Corte ou que de alguma maneira tinham ligação com as forças colonizadoras procuravam minimizar a gravidade dos crimes. Os teólogos mais independentes, como Francisco de Vitória e Molina, aplicavam de maneira mais justa a Teologia Moral no tocante a estes casos.

A importância destes debates não pode ser hoje menosprezada, assim como não podemos deixar de perceber a enorme importância e gravidade de que era revestida a excomunhão ministrada por D. Bartolomeu, ou uma simples definição de que tal ou tal ação constitui pecado mortal. Mesmo os mais gananciosos e empedernidos criminosos apavoravam-se com a simples idéia de serem excomungados.

As possessões espanholas eram governada por vice-reis, que detinham prerrogativas de Padroado; a eles competia nomear bispos e instalar dioceses e paróquias. O clero que acompanhava estes vice-reis e era posto sob sua tutela direta pertencia predominantemente às ordens mendicantes (franciscanos e dominicanos). Os jesuítas, porém, operavam de maneira bastante diferente. A Companhia de Jesus operava sob as ordens diretas do Papa, não estando portanto sujeita à tutela direta dos vice-reis espanhóis. Os jesuítas eram aceitos de bom grado pelos espanhóis, mas não faziam parte do sistema. Ainda que obedecendo às determinações legais de colocar os índios sob a suserania do Rei de Espanha, eles não procuraram em momento algum mesclar as populações indígenas às populações espanholas, como havia sido e era ainda feito pelo clero diretamente às ordens dos vice-reis.

Tendo percebido os horrores advindos do sistema de comendas e da exploração da mão-de-obra indígena por parte dos colonos espanhóis, os jesuítas preferiram agir em prol dos índios. A entrada de espanhóis nas reduções jesuíticas só podia ocorrer em circunstâncias especiais, requerendo permissão. Os índios não eram entregues aos colonos, nem tampouco o eram as terras indígenas.

Neste contexto histórico, é fácil perceber tanto a importância do trabalho dos jesuítas quanto as dificuldades por eles enfrentadas.

A América Espanhola

Quando os espanhóis chegaram às Américas continentais, eles encontraram civilizações relativamente avançadas, de alto nível de organização: os Astecas e os Incas. Para os padrões europeus, ambas eram extremamente primitivas em termos tecnológicos; a tração animal era-lhes desconhecida, assim como não conheciam nem as armas de fogo nem o ferro, fundamental para a construção das armaduras que tornavam os espanhóis virtualmente imunes às flechas e espadas de obsidiana dos nativos.

Aproveitando-se das rivalidades tribais, os conquistadores espanhóis lograram subjugar, em tremenda inferioridade de números, os numerosíssimos e aguerridos exércitos idólatras. Em sua justa indignação, causada pelo horrendo espetáculo dos morticínios rituais astecas, os conquistadores desfizeram em grande medida as instituições e a hierarquia social presente antes de sua chegada. Esta organização, porém, não tinha uma história muito longa. Os povos do México haviam sido subjugados pelos astecas há relativamente pouco tempo, e o domínio asteca não estava demasiadamente imbricado no tecido social. Cada povo não-asteca ainda tinha seus próprios reis e príncipes, que pagavam aos astecas impostos em homens e mulheres a serem sacrificados aos ídolos.

Havia porém uma sociedade organizada, de tal forma que a chegada dos espanhóis às praias rapidamente chegavam aos ouvidos dos governantes no altiplano. Isso forçou um confronto maior e levou a uma rápida penetração espanhola em território asteca. Esta penetração, seguida por sucessivas vitórias militares com o auxílio dos povos subjugados pelos astecas, incentivados pelos espanhóis a levantar-se contra seus opressores, fez com que uma governança espanhola fosse logo estabelecida.

Devido ao direito de Padroado de que gozavam os reis de Espanha, foram imediatamente estabelecidas circunscrições não apenas administrativas civis e militares, mas também religiosas. As dioceses eram estabelecidas à medida que o era o governo civil. Enviados em autoridade pelo governo espanhol, os vice-reis tinham o poder de estabelecer novas dioceses e paróquias, facilitando tremendamente o trabalho de evangelização.

Quando da chegada espanhola na costa oeste sul-americana, foi igualmente encontrada uma civilização de grande complexidade administrativa. Assim, a chegada dos primeiros espanhóis foi imediatamente levada ao conhecimento dos Incas em Cuzco, nas altas montanhas andinas. Enviados espanhóis foram imediatamente buscar a conversão dos príncipes, sendo recebidos com injúrias e desprezo. Os espanhóis então atacaram com força. Movidos igualmente pelo desejo de reparar o ultraje a Nosso Senhor e pelo desejo do ouro, farto naquelas terras, imediatamente encetaram a conquista dos territórios dominados pelos Incas, destruindo assim o outro grande Império latino-americano pré-colombiano.

Neste primeiro contato com as civilizações mais avançadas das Américas, cabe lembrar, ainda não estavam presentes os jesuítas. As primeiras excursões espanholas tiveram como seus capelães principalmente franciscanos e, em menor quantidade, dominicanos.

A América Portuguesa

Na América Portuguesa a situação foi bastante diferente. Nas terras cuja evangelização foi confiada aos portugueses, a leste das Tordesilhas, não haviam nenhuma civilização avançada. Centenas de tribos indígenas primitivíssimas, inimigas umas das outras, digladiavam-se e entregavam-se ao canibalismo. Nestas circunstâncias, não havia evidentemente um governo central ao qual a chegada dos portugueses fosse noticiada, não houve tropas enviadas do interior para a costa, não houve, em suma, nenhum motivo para uma rápida penetração além da costa. Somando-se ainda o fato de Portugal ser um país pequeno, já engajado em colonização e comércio costeiros com enorme parcela da África e do Sul da Ásia o que fazia com que os recursos humanos portugueses já estivessem esticados ao limite é fácil perceber a razão por que a colonização portuguesa inicialmente restringiu-se a uma estreitíssima faixa costeira. Até a chegada dos primeiros missionários jesuítas, havia apenas dois franciscanos em Porto Seguro, chegados em 1516, e outros dois em São Vicente (litoral paulista), chegados em 1530.

Com a chegada dos jesuítas à obra da evangelização americana, porém, esta situação se modificou em grande parcela. Levados pelo desejo de evangelizar os índios, livrando-os do canibalismo e de similares costumes bárbaros, os jesuítas rapidamente encetaram fascinante obra de evangelização dos territórios em domínio português. Foram eles os primeiros a avançar a pé pelo litoral, buscando evangelizar as tribos indígenas e inculturar para aqueles povos a mensagem do Salvador. Devemos aos jesuítas a fundação e o estabelecimento não só de grande parcela da povoação costeira no Brasil, como a costa capixaba, como também a fundação de São Paulo, o primeiro estabelecimento ocidental no interior brasileiro. Desta vila, porém, em amarga ironia, viriam mais tarde ataques assassinos contra as futuras reduções jesuítas no Paraguai.

No Ano da Graça de Nosso Senhor Jesus Cristo de 1549, no dia de Santo Inácio (1o de fevereiro) partiu de Lisboa a primeira missão jesuíta portuguesa para a terra do Brasil. Seis eram os jesuítas que nela vieram, incluindo o superior, Pe. Manuel da Nóbrega. No ano seguinte seis mais padres vieram. Sendo tal número de padres insuficiente para tão vasto território, foram enviados em 1553 mais dois padres e quatro irmãos, dentre eles o Bem Aventurado José de Anchieta (1534-1597), o mais novo da expedição.

Contrariamente ao que ocorria nas terras espanholas, a evangelização do Brasil começou principalmente com os jesuítas. Apesar de terem os reis de Portugal direito também de Padroado, só muito indiretamente era este direito exercido; não foram por estes reis nomeados vice-reis que pudessem exercê-lo, o que fazia com que fossem necessárias ordens vindas da Europa (viagem de meses de barco em cada sentido) para a ereção canônica de uma paróquia. Assim, continuou o Brasil por muito tempo a ser território de Missão. Até 1676 a única diocese em território brasileiro era a da Bahia, fundada em 1551.

A penetração do território português

Em aberta desobediência às determinações da Igreja, era costume entre os portugueses a escravização de indígenas. Somando-se este mau e criminoso hábito às tremendas guerras movidas pelos colonizadores e às doenças provocadas nos índios pelo contato com os brancos, houve rapidamente grande diminuição da povoação indígena no território brasileiro. As tribos do sertão foram exterminadas quando do início da criação de gado na região, com os colonos acusando os nativos de roubar-lhes o gado. Poucas foram as zonas em que a colonização portuguesa foi feita em paz com os índios. Um exemplo é a colonização do Ceará, que nos primeiros anos do século XVII foi pacificado sem morticínios por um jovem capitão, Martim Soares Moreno, acompanhado por apenas cinco soldados e um capelão.

A regra nas terras sob domínio português era a barbárie aberta contra os índios. Contra isso levantaram-se logo os jesuítas, o que lhes causou não poucos problemas. O Pe. António Vieira (1608-1697), nascido em Lisboa mas criado no Brasil desde tenra idade, ao voltar em 1653 de sua formação em Portugal (onde chegou a ser confessor do Rei D. João IV) e ver a situação dos índios no Maranhão e no Pará, causou furor ao dizer com todas as letras aos portugueses que estavam todos em pecado mortal e iriam diretamente para o Inferno.

Quando voltou a Portugal exigiu do Rei que fossem protegidos os índios, conseguindo então em 1655 nova legislação coibindo os fortíssimos abusos cometidos contra estes povos. Com este poderoso auxílio, foi possível para os jesuítas evangelizar e aldear em 54 reduções cerca de duzentos mil índios. O próprio Pe. Antônio Vieira conseguiu pacificar, pela prédica sincera da Palavra, quarenta mil nativos da Ilha de Marajó. Os nativos eram aldeados e dedicavam-se, sob a tutela espiritual dos bons padres jesuítas, à criação de gado. Cedo, porém, a riqueza em gado e em terras dos índios provocou a inveja dos colonos portugueses, que viam seus antigos escravos em situação melhor que a deles próprios. Em 1661, os jesuítas (inclusive Pe. Antônio Vieira) foram expulsos do Maranhão e tiveram que voltar a Portugal. Cedendo aos colonos, o Rei permitiu que os índios fossem distribuídos para o serviço dos colonos. Apenas dezessete anos mais tarde, em 1680, conseguiu Pe. Antônio Vieira do novo Rei, D. Pedro II, nova legislação concedendo a terra aos índios "como senhores originais e naturais dela".

Em 1684, contudo, estourou nova revolta. Os colonos maranhenses, encabeçados por Manoel Beckman (o "Bequimão") e Jorge Sampaio, conseguiram novamente expulsar os jesuítas. Depois de debelada a rebelião e devidamente punidos (com a pena de morte) os líderes desta insurreição escravagista, os jesuítas viram-se contudo forçados a ceder parcialmente e permitir que os índios trabalhassem para os colonos seis meses por ano. Infelizmente foram também autorizadas expedições armadas para o interior, que na prática nada mais eram que expedições em busca de escravos em tempo integral.

Pe. Antônio Vieira foi também o responsável pela redação do Regimento das Missões, o regulamento que foi desde 1686 a regra a ser seguida pelos missionários, que passaram a buscar a evangelização e aldeamento dos índios nos seus lugares de origem, mantendo-os longe dos colonos. Quando chegaram outras congregações missionários, foi também por elas adotado este Regimento. A imensa maioria das cidades mais antigas do Norte brasileiro começou como aldeamento jesuíta.

É impressionante notar a relação direta entre a atividade missionários jesuíta e a formação étnica das regiões brasileiras. Nas regiões onde o contato inicial foi feito pelos jesuítas e por eles mantido (ou ao menos segundo o Regimento jesuítico), a imensíssima maioria da população é de origem étnica indígena; nas regiões onde os jesuítas chegaram após os colonizadores brancos, a população é mestiça de índio e branco; onde os jesuítas foram expulsos cedo, ou onde não houve presença jesuíta, a população indígena foi praticamente dizimada.

O mesmo pode ser dito acerca das regiões espanholas em que as tribos indígenas não estavam organizadas. Enquanto nas áreas sob domínio Inca e Asteca foi possível aos espanhóis a manutenção de uma estrutura hierárquica local, reformada para ser posta a serviço da Coroa espanhola, nas áreas anteriormente ocupadas por índios selvagens só persiste um largo componente étnico ameríndio nas regiões cuja evangelização foi feita pelos jesuítas. No Paraguai, território de responsabilidade quase exclusiva dos jesuítas, não apenas foi mantida ilesa a população nativa, como sua língua nativa é até hoje a língua comum.

As técnicas de penetração

Aos jesuítas não agradavam as técnicas espanholas que os franciscanos e dominicanos em geral aceitavam. A simples leitura por um intérprete de um texto que poderia ser resumido grosseiramente em "aceite a Deus e ao Rei como seus superiores por bem ou o faremos aceitar por mal" não lhes condizia em absoluto. As técnicas dos colonizadores portugueses eram-lhe ainda mais repulsivas. O objetivo dos jesuítas era, antes de mais nada, a conversão verdadeira dos índios. Tanto espanhóis quanto portugueses queriam reduzir os índios a escravidão; a única diferença era a maior honestidade dos portugueses, que não disfarçavam sob títulos pomposos e pseudo-misericordiosos os seus intentos.

Assim, os jesuítas procuraram manter-se longe dos colonizadores, trabalhando por conta própria. Armados apenas com seus utensílios sacros e alguns instrumentos musicais, os jesuítas adentravam as matas e caminhavam enormes distâncias, de modo a serem os primeiros a encontrar os índios. Encontrando-os, tocavam música para atraí-los. Atraindo-os, procuravam contar a eles a Boa Nova e convencê-los, sem jamais usar da força, a aderir à religião cristã.

Para isso eles aprenderam as línguas indígenas, compilaram dicionários e gramáticas, e chegaram ao ponto de criar uma língua nova, amálgama das línguas faladas pelos índios da costa brasileira, para que se tornasse possível a comunicação entre todas as tribos. A esta língua foi dado o nome de "Nheengatu", ou Língua Geral.

O objetivo dos jesuítas era a evangelização, não a europeização dos índios. Isso causou enormes dificuldades com os colonizadores, pois apesar da aceitação geral pelos índios evangelizados da suserania do Rei eles não se tornavam pequenos espanhóis ou pequenos portugueses. Não aprendiam a falar as línguas européias e mantinham todos os seus hábitos culturais que não fossem contrários à Lei Cristã. Era, em suma, criada uma nova cultura cristã de base indígena.

As missões e reduções

Em 1604, pregando aos colonizadores espanhóis em Assunção, o Pe. jesuíta Lorenzana despertou o ódio geral ao ameaçar com a cólera divina os espanhóis se não libertassem os índios que haviam escravizado em incursão pelo interior. Esta foi a gota d'água. A situação tornou-se tensa demais entre os jesuítas e a população espanhola; calúnias surgiram por toda parte, e algo precisava ser feito.

Por mais desagradável que tenha sido, entretanto, este incidente causou indiretamente um grande bem. Afinal, o Rei D. Felipe III já havia proibido em 1601 a escravidão indígena. Em 1606 ele exigiu o desenvolvimento do sistema reducional nos novos contatos com nativos, e reiterou esta ordem em 1609. Três anos depois, em 1607, o superior geral da Companhia, Pe. Cláudio Aquaviva, erigiu uma província nova da Companhia de Jesus: a Província do Paraguai, dedicava à evangelização dos índios no interior. Esta província, que começou com oito padres, já contava com 113 sacerdotes sete anos depois. Seu primeiro superior provincial foi o Pe. Torres, a quem o Visitador do Rei , D. Francisco de Alfaro, sugeriu a vinculação direta das novas reduções à Coroa, para libertar os jesuítas dos entraves causados pelos colonizadores e pelas autoridades cúmplices do tráfico de escravos.

Partindo assim das regiões dominadas pela Espanha, missionários jesuítas avançaram rumo ao sudeste, adentrando as amplas planícies dos Pampas e do Chaco. Nestas planícies, encontraram tribos indígenas semelhantes às existentes no território dominado pelos portugueses, não culturas desenvolvidas e hierarquizadas como haviam anteriormente encontrado os espanhóis no México e nos Andes.

Atraindo-os pacificamente, os jesuítas lograram construir o que já foi chamado "a utopia de mais longa duração": a República das Missões. "Reduzindo" os índios, ou seja, convencendo-os a viver em "reduções", em cidades construídas de pedra, os jesuítas edificaram uma verdadeira civilização cristã indígena em um território que hoje faz parte do Paraguai, Uruguai e Brasil. A língua dos índios - o guarani, até hoje falado por ampla parcela da população paraguaia - foi mantida; a autoridade de seus caciques foi respeitada; suas regras de vida, quando não contrárias ao Evangelho, permaneceram em prática. Uma nova civilização começou a desenvolver-se.

Estas missões, ou reduções, foram certamente um fenômeno único na história da América Latina. Afastando-se dos bárbaros colonos europeus, os jesuítas avançaram da antiga terra dos Incas a oeste, penetrando no atual território paraguaio, uruguaio, brasileiro e argentino. A "República Guarani", estabelecida pelos jesuítas sob a suserania do Rei da Espanha, tinha características administrativas ímpares. Séculos antes de qualquer outro Estado proibir a pena de morte, já era tal a regra nas Missões. A música, as artes, os ofícios mais variados eram ensinados pelos jesuítas aos índios. O talento natural dos nativos para as artes foi descoberto e desenvolvido à perfeição por seus mestres jesuítas. Basta dizer que foram construídas belíssimas catedrais, dotadas de órgãos de tubos; que foram organizados, treinados e ensaiados à perfeição corais de por vezes mais de mil cantores; que foram feitas orquestras; que até hoje a harpa, instrumento aristocrático por excelência, é no Paraguai instrumento popular entre os descendentes dos índios missioneiros.

Nas missões era a priori proibida a entrada de brancos; apenas os padres e irmãos jesuítas transitavam livremente por estes territórios. Esta medida visava evitar não apenas a captura dos índios pelo escravagistas espanhóis, como também a proteção dos nativos evangelizados contra o deletério efeito da pouquíssima moral da ralé colonizadora. Este foi um trabalho dificílimo em seu início; os feiticeiros, evidentemente, buscavam rebelar os índios contra os jesuítas; freqüentemente os índios que não haviam nascido nas reduções relapsavam em antigos hábitos e entregavam-se à embriaguez, ao canibalismo, ao assassinato. Com o tempo, porém, à medida que as novas gerações foram crescendo e suplantando os antigos, que lembravam da vida selvagem, estes problemas foram acabando, apenas para serem substituídos pelos choques com os espanhóis e, mais grave, com as criminosas excursões dos bandeirantes com o propósito de seqüestrar índios missioneiros e reduzi-los à escravidão.

A organização social das missões era, inicialmente, uma versão cristianizada da organização tribal; os caciques mantinham a sua autoridade, que pouco a pouco diminuía até ser atingida uma quase igualdade entre os índios. O padre não participava diretamente da administração secular senão como consultor com poder de veto. Suas sugestões eram evidentemente acatadas, mas as minúcias do governo eram deixadas nas mãos dos índios, que elegiam livremente seus líderes (os caciques viram-se aos poucos transformados em uma nobreza honorífica, sem direito de mando real).

Este não foi um trabalho fácil. Os padres chegavam a pé, sozinhos, armados apenas com seus utensílios litúrgicos, e atraíam os nativos pela música. Falando com eles em suas próprias línguas - para isso foram compostas pelos jesuítas gramáticas e dicionários -, era-lhes anunciada a Boa Nova. Atraídos então pelos padres para uma vida sedentária, os índios construíam, sob a orientação dos missionários, aldeias e cidades cujas ruínas até hoje não deixam de impressionar os visitantes. Estas cidades de pedra eram feitas do nada; cada ferramenta, cada martelo, era construído pelos índios com os materiais de que pudessem dispor, sob as instruções de mestres jesuítas.

As missões eram completamente auto-sustentadas. Criava-se gado, plantava-se o necessário, minerava-se e fundia-se o ferro. Os impostos eram pagos à Coroa espanhola em espécie, visto não circular dinheiro nas Missões. Tudo nestas vastas cidades indígenas era comum; não havia bens particulares, não havia selvageria. Os raros criminosos eram levados, ou melhor, iam de bom grado ao padre, que determinava sua punição. Após serem punidos, normalmente voltavam os índios para agradecer ao sacerdote.

Não se trata de pequenas comunidades de hippies com algumas dezenas de pessoas; o território missioneiro contava em 1700 com 73 religiosos nas 30 reduções já fundadas: 8 no atual Paraguai, 15 na atual Argentina e 7 no atual Rio Grande do Sul. Nelas viviam noventa mil índios, que formavam vinte e três mil famílias. Nos 158 anos que durou a República Guarani, houve apenas sete visitações episcopais.
Confrontos e inimizades

O maior inimigo das missões em seus primeiros anos foram os bandeirantes paulistas. As incursões escravagistas destes mercenários provocavam tamanho terror entre os índios que aqueles eram comparados por estes a demônios encarnados. Há até mesmo uma interessante amostra desta percepção - não de todo errônea - a ser vista ainda hoje em uma igreja gaúcha: uma escultura de S. Miguel Arcanjo em que ao invés de representar o Santo pisando em um demônio vencido ele é mostrado pisando em um bandeirante.

Os ataques bandeirantes tinham na verdade duas causas. Além da busca de escravos, objetivo primeiro dos aventureiros na ausência de ouro e pedras preciosas, havia por trás de tudo uma dura questão política. Os bandeirantes não eram mais portugueses; consideravam-se antes de mais nada paulistas. Somando-se a esta identidade primordialmente local o fato de que o Trono de Portugal esteve em mãos espanholas de 1580 a 1640, diminuindo mais ainda qualquer reconhecimento de autoridade superior por parte dos aventureiros, e o apoio dos colonos portugueses e espanhóis, que não viam com bons olhos as reduções cheias de índios enquanto eles trabalhavam sem auxílio escravo, as incursões bandeirantes eram também afirmações do domínio territorial que desejavam ter naquelas regiões. A Coroa Espanhola, que acabaria por lucrar mais cedo ou mais tarde com os frutos das minerações bandeirantes, fechava normalmente os olhos a tais incursões. Estavam assim os índios e os jesuítas forçados a defender-se por sua própria conta e risco, com as armas que pudessem fabricar e valendo-se apenas de suas próprias forças, sem esperança de auxílio exterior.

Durante o período de união das coroas ibéricas foram muitos os ataques dos bandeirantes. A partir de 1628 eles foram se tornando progressivamente mais graves; em uma só incursão, certa feita, foram capturados e escravizados pelos paulistas trinta mil índios missioneiros. No período de dois anos que vai de 1628 a 1630 foram raptados ao todo cerca de sessenta mil índios. As reduções da região de Guaíra, no atual território brasileiro, tiveram que ser abandonadas em 1631, quando os padres Montoya e Mendoza encabeçaram uma multidão de doze mil índios, atravessando selvas e lugares onde até hoje não há estradas para fugirem da sanha bandeirante e refugiar-se nas missões situadas juntos aos rios Paraná e Alto-Uruguai.

Em 1639, às vésperas da separação de Portugal e Espanha, a Coroa espanhola permitiu que os índios usassem armas de fogo. Foram então fabricados arcabuzes e outras armas leves, com as quais poderiam finalmente defender-se das incursões predadoras dos bandeirantes.

A maior batalha entre os missioneiros e os paulistas, com avassaladora derrota destes, foi a Batalha de Mbororé, no dia 11 de março de 1641. No Rio Uruguai enfrentaram-se 800 bandeirantes acompanhados por seis mil índios tupis, seus aliados, e quatro mil guaranis missioneiros. Os bandeirantes portavam todos armas de fogo; os tupis usavam azagaias e flechas, e os guaranis tinham, ao todo, 57 arcabuzes. A estes, porém, somavam-se engenhosos canhões feitos de bambu grosso envolto em couro, que atiravam balotes de pedra com peso e força suficiente para fazer naufragar uma canoa.

Ao ver aproximarem-se os bandeirantes, o líder guarani, Cacique Inácio Abiaru, avançou com poucos guerreiros e bradou ser uma vergonha que gente que se dissesse cristã quisesse escravizar a outros cristãos. A isso nada respondeu o chefe bandeirante, capitão-mor Manoel Pires. A batalha então começou. Dois dias de batalha ininterrupta depois, vendo as balas de pedra dos canhões de bambu arrasando suas tropas; recebendo o fogo certeiro dos arcabuzes dos guaranis; sofrendo tamanha chuva de flechas que mal podiam sair de seus abrigos, os bandeirantes procuraram convencer os missioneiros que não eram escravagistas, estavam apenas em busca de outros bandeirantes desaparecidos naquela região. De nada lhes valeu a artimanha. Foram desbaratados, e fugiram de volta ao planalto paulista com os guaranis em seus calcanhares. Durante muito tempo não voltaram os bandeirantes a atacar as reduções.

Começava então a fase áurea das reduções. A maior parte dos índios já havia nascido nas missões; os antigos hábitos de canibalismo, roubo, estupros já haviam sido abandonados, e tudo isso já não mais ocorria.

Um problema de natureza diferente, porém, impedia o pleno florescimento desta belíssima civilização cristã guarani. A incerteza das fronteiras traçadas pelo Tratado de Tordesilhas fazia do direito de posse o verdadeiro indicador de soberania. Portugal e Espanha cobiçavam aquelas terras férteis, consideradas como suas de direito por ambos os lados. Como os jesuítas que povoaram a região haviam saído de território espanhol e pertenciam a uma província eclesiástica sediada em Assunção, cidade incontestavelmente pertencente à Espanha, a vassalagem da República Guarani era prestada aos Reis de Espanha. Seus impostos iam para a Coroa Espanhola, e pela Coroa Espanhola foram nomeados defensores da fronteira oriental.

Isso não era visto com bons olhos pela Coroa portuguesa, que ambicionava aquelas terras. Durante cem anos persistiu a questão de fronteira, com os índios guaranis das Missões defendendo ardorosamente seu território contra os ataques das tropas portuguesas e paulistas e dos maus colonizadores espanhóis.

O fim das Missões e da Companhia

Os colonizadores portugueses e os paulistas, como já vimos, não viam com bons olhos aquele gigantesco enclave armado e auto-suficiente em uma terra que consideram sua por direito. Os colonizadores espanhóis, porém, tampouco aceitavam de bom grado a presença das reduções, que os privavam de mão-de-obra escrava (ilegal, mas amplamente utilizada). Além disso, quando de uma sublevação em Assunção em 1753, quando se instaurou uma Comuna independente, o exército guarani sitiou a cidade e a fez retornar à submissão à Coroa, o que evidentemente não contribui para aumentar sua popularidade entre os habitantes. As acusações foram tamanhas que foi ordenada em Madri uma investigação completa, cujo resultado foi favorável aos guaranis.

Em 1750, finalmente, foi assinado o Tratado dos Sete Povos, que expulsou do atual território brasileiro as sete reduções jesuíticas. Foram expulsos de nosso território os trinta mil habitantes que se viram forçados a abandonar os corpos de seus ancestrais em cemitérios tomados depois pelo mato, a abandonar suas imensas plantações, a esvaziar edifícios lindíssimos construídos pelo trabalho de gerações de índios cristãos. Foi forçado a sair do atual território brasileiro, por medo de ser escravizado, o único povo que não tinha pena de morte em sua legislação, o povo que fazia as mais belas obras de arte, o povo que produziu os primeiros impressos de toda a América.

Doze anos depois, em 1762, o Tratado foi revogado e o território dos Sete Povos voltou à Coroa espanhola. Os índios puderam voltar, mas por pouco tempo. Em 1767, o Conde de Aranda determinou a expulsão dos jesuítas dos territórios da Coroa da Espanha. O Marquês de Bucarelli, governador de Buenos Aires, recebeu a incumbência de efetuar a expulsão, com instruções determinando que ele fosse morto se ao fim do ano restasse algum jesuíta, ainda que doente ou à beira da morte, em sua área. Esquadrões de cavalaria fizeram ser cumprida a ordem, levando embora os jesuítas - muitos dos quais já haviam esquecido suas línguas nativas e só sabiam o guarani e o latim - em meio às lágrimas dos valentes índios, que não ousavam levantar-se contra o Rei de Espanha que tantas vezes haviam defendido.

As reduções passaram à administração colonial espanhola, terminando com o belo trabalho de já mais de século e meio dos jesuítas. Os índios aos poucos foram se afastando, e hoje as Missões são apenas as impressionantes ruínas de elevadíssima civilização.

Nos territórios submetidos à Coroa portuguesa, a queda dos jesuítas foi quase simultânea. O Marquês de Pombal, maçom fervoroso e iluminista às raias da caricatura, ordenou a expulsão sumária dos jesuítas de todo o território português, acusando-os de tentativa de regicídio. Em 19.I.1759 foram confiscados todos os bens da Companhia nos territórios portugueses. Em 3.IX.1759, foram expulsos todos os padres. Isso foi feito de maneira tão violenta e brutal que o próprio Voltaire afirmou que "l'excès du ridicule et de l'absurdité y fut joint à l'excès d'horreur".

A campanha contra os jesuítas, na verdade, era universal. Alvo dos mais ferozes ataques de todos os hereges, dos protestantes aos iluministas, os filhos de Santo Inácio de Loiola acabaram por sofrer o mais baixo de todos os golpes pela mão do Papa Clemente XIV (1769-1774), que fôra eleito com apoio dos governos antijesuítas. O irmão do Marquês de Pombal foi feito Cardeal, e a Companhia de Jesus foi extinta. O superior Geral da Companhia, Pe. Lourenço Ricci (1758-1773), foi encarcerado no Castel Sant'Angelo, onde passou o resto de seus dias. Foi o momento mais negro da história do Papado, e o fim da Companhia de Jesus tal como estabelecida por Santo Inácio. O caminho estava livre para Revolução que alguns anos mais tarde banhou a França em sangue. Abriram-se as portas para a lenta transformação da Cristandade na barbárie do Século XX.

Fonte:

RAMALHETE, Carlos. Os Jesuítas na América latina. Blog A Hora de São Jerônimo. Disponível em: http://hsj-online.blogspot.com/2011/03/os-jesuitas-na-america-latina.html Acesso em: 25 Junho 2011.

quinta-feira, 23 de junho de 2011

São Thomas Morus

Por G. K. Chesterton
St. Thomas More, capítulo retirado do livro The Well and the Shallows (1935).

A maioria das pessoas não entenderia a expressão de que a mente de Morus era como um diamante que um tirano atirou a um fosso porque não podia quebrá-lo. Não é senão uma metáfora; mas há vezes em que acontece de a metáfora ter muitas faces, como o diamante. O que moveu o tirano a ter tal horror àquela mente era a clareza dela. Era ela o extremo oposto de um cristal turvo, repleto somente de sonhos opalescentes ou de fantasmas do passado.

O rei e seu ilustre chanceler foram companheiros tanto quanto contemporâneos. Sob muitos aspectos, ambos eram homens renascentistas; mas sob alguns aspectos, aquele que era o homem mais católico era também o menos medieval, ou seja, havia talvez mais no Tudor daquele mero resto antiquado de medievalismo decadente que os verdadeiros reformadores da Renascença notaram ser a corrupção do tempo. Na mente de Morus não havia senão clareza; na de Henrique – embora ele não fosse nenhum tolo e certamente nenhum protestante – havia um quê de confuso conservadorismo. Como todo bom homem que calha de ser anglo-católico, este tem um toque de antiquado. Thomas Morus era mais racional, motivo pelo qual não havia nada em sua religião que fosse meramente local, ou, nesse sentido, meramente leal.

A mente de Morus era tal qual um diamante também por seu poder de cortar vidro, de penetrar coisas que, conquanto pareçam transparentes, são ao mesmo tempo menos sólidas e menos multifacetadas. Pois, na verdade, as heresias verdadeiramente consistentes geralmente parecem muito claras, como naquela época o calvinismo e agora o comunismo. Algumas vezes elas até parecem muito verdadeiras. Algumas vezes elas até são muito verdadeiras, no sentido limitado de uma verdade que é inferior à Verdade. Elas são, a um só tempo, mais tênues e mais quebradiças do que o diamante, pois é comum que uma heresia não seja uma simples mentira. Como o próprio Thomas Morus disse, “nunca houve um herege que só falasse falsidades”. Uma heresia é uma verdade que esconde todas as outras verdades. Uma mente como a de Morus estava cheia de luz, como uma casa feita de janelas; mas as janelas olham para fora, para todos os lados, em todas as direções. Nós poderíamos dizer que assim como a jóia tem muitas facetas, também o homem tem muitas faces. Nenhuma delas, contudo, é máscara.

Ora, essa grandiosa história tem tantos aspectos que a dificuldade de tratar dela num artigo tem que ver com a seleção, mas ainda mais com a proporção. Eu poderia tentar e falhar em fazer justiça a seu aspecto mais elevado, àquela santidade que agora está além até mesmo da Beatitude. Eu poderia igualmente preencher todo o espaço com a mais despretensiosa das brincadeiras com que o ilustre humorista se deleita na vida diária: talvez a maior brincadeira de todas seja o livro chamado “Utopia”. Os utopistas do séc. XIX imitaram o livro sem enxergar a brincadeira. Mas dentre uma perturbadora complexidade de aspectos ou ângulos tão diferentes, eu decidi tratar apenas de dois pontos. Embora a importância deles seja muito grande, não o faço porque sejam as mais importantes verdades sobre Thomas Morus, mas porque são duas das mais importantes verdades sobre o mundo no presente momento. Uma mostra-se mais claramente na morte dele, a outra em sua vida – ou talvez fosse preferível dizer que uma tem que ver com sua vida pública e a outra com sua vida privada. Uma está muito além de qualquer admiração conveniente, e a outra pode parecer, em comparação com aquela, um anticlímax quase cômico. Mas uma acerta em cheio nossa atual discussão sobre o Estado, e a outra a sobre a família.

Thomas Morus morreu a morte de um traidor por afrontar a monarquia absoluta, no sentido estrito de tratar a monarquia como um absoluto. Ele desejava e até ansiava por considerá-la algo relativo, mas não algo absoluto. A heresia que havia subido às cabeças no tempo dele era a heresia chamada Direito Divino dos Reis. Sob essa forma, ela é hoje considerada uma antiga superstição, mas já reapareceu como uma novíssima superstição sob a forma do Direito Divino dos Ditadores. Entretanto, a maioria das pessoas ainda pensa que ela é antiga. E quase todas elas pensam que ela é muito mais velha do que é. Uma das principais dificuldades de hoje é explicar às pessoas que essa ideia não era inerente à época medieval ou a tempos mais antigos.

As pessoas sabem que o controle constitucional sobre os reis foi crescendo por um século ou dois. Elas não percebem que qualquer outro tipo de controle jamais poderia ter funcionado. E, mudado o contexto, aqueles outros controles são difíceis de descrever ou de imaginar. Mas o homem medieval sem dúvida pensava no rei como governando sub deo et lege – traduzindo literalmente, “sob Deus e a lei”, mas envolvendo também algo atmosférico que, mais indefinidamente, poderíamos chamar de “sob a moralidade subentendida em todas as nossas instituições”. Os reis eram excomungados, eram depostos, eram assassinados, eram objeto de toda sorte de tratamentos, defensáveis e indefensáveis, mas ninguém pensava que a comunidade inteira sentia com o rei, ou que ele sozinho tinha autoridade suprema. O Estado não possuía os homens tão completamente, nem mesmo quando podia mandar empalá-los, como agora o possui nos lugares em que pode mandá-los para a escola primária. Havia uma ideia de refúgio que geralmente era uma ideia de santuário. Em suma, de mil estranhas e sutis maneiras, como deveríamos pensá-las, havia uma espécie de escape. Havia limites para César; e havia liberdade em Deus.

A mais alta voz da Igreja declarou que este herói era, no sentido verdadeiro e tradicional, santo e mártir. E é apropriado lembrar que, por uma razão muito especial, ele de fato está posto junto daqueles primeiros mártires cujo sangue foi a semente da Igreja nas primeiríssimas perseguições feitas pelos pagãos. Pois a maior parte deles morreu, como ele também, por se recusar a converter uma lealdade civil em idolatria religiosa. A maior parte deles não morreu por se recusar a adorar Mercúrio ou Vênus, ou figuras lendárias que se podia supor que não existissem, ou outras como Moloch ou Priapo, que era razoável esperar que não existissem. A maior parte deles morreu por se recusar a adorar alguém que realmente existiu e mesmo alguém a quem estavam de todo prontos a obedecer, mas não a adorar. O típico martírio geralmente ataca a prática de queimar incenso ante a estátua do Divino Augusto, a sacra imagem do imperador.

Ele não era necessariamente um demônio a ser destruído, mas simplesmente um déspota que não deve ser transformado em divindade. E é aí que o caso dos mártires chega assim tão perto do problema prático de Thomas Morus e assim tão perto do problema prático do atual culto ao Estado. E é típico de todo pensamento católico que os homens morram em tormentos, não porque seus inimigos “só falassem falsidades”, mas simplesmente porque eles não poderiam prestar uma reverência imoderada quando estavam perfeitamente prontos a prestar um respeito moderado. Para nós, o problema do progresso é sempre um problema de proporção: aperfeiçoamento é chegar a uma justa proporção e não meramente avançar numa direção. E nossas dúvidas a respeito da maioria dos incrementos modernos – a respeito dos socialistas na última geração, ou dos fascistas nesta geração – não procede de termos quaisquer dúvidas sobre a necessidade de justiça econômica ou de ordem nacional mais do que Thomas Morus deu-se ao trabalho de objetar uma monarquia hereditária. Ele objetou o Direito Divino dos Reis.

No sentido mais profundo, ele é então o paladino da liberdade em sua vida pública e em sua ainda mais pública morte. Em sua vida privada, ele é o tipo de verdade menos compreendida atualmente: a verdade de que a verdadeira morada da liberdade é a casa. Novelas modernas, jornais e teatros de tese (problem plays)[1] foram-se amontoando numa enorme pilha de lixo para esconder esse simples fato; um fato que pode ser provado de modo bastante simples. A vida pública deve ser quiçá mais regulada do que a vida privada, assim como um homem não pode perambular pelo trânsito de Picadilly exatamente da mesma forma que poderia perambular por seu próprio jardim. Onde há trânsito, deve haver um regulamento de trânsito. E isso também vale – ou vale ainda mais – quando há o que poderíamos chamar de trânsito ilícito, quando os governos mais modernos organizam esterilizações hoje e é possível que amanhã organizem infanticídios.

Aqueles que sustentam a superstição moderna de que o Estado não é capaz de fazer nada de errado serão obrigados a aceitar tal coisa como verdade. Se indivíduos têm qualquer esperança de proteger suas liberdades, eles precisam proteger sua vida familiar. No pior dos casos, haverá mais adaptação pessoal num lar do que num campo de concentração; no melhor dos casos, haverá menos rotina numa família do que numa fábrica. Em qualquer lar minimamente saudável, as regras são afetadas pelo menos parcialmente por coisas que não podem de modo algum afetar as leis estabelecidas, como ocorre, por exemplo, com aquilo que chamamos de senso de humor.

É por isso que Morus é vivamente importante como o humorista, como representante dessa fase especial do humanista. Por trás de sua vida pública, tão grandiosa quanto uma tragédia, havia uma vida privada que era uma perpétua comédia. Ele era, como o Sr. Christopher Hollis diz em seu excelente estudo, “um incorrigível pregador de peças”[2]. Todos sabem, é claro, que comédia e tragédia encontraram-se – como se encontram em Shakespeare – naquele alto palco de madeira em que o drama de Morus terminou. Naquele terrível momento, ele percebeu e apreciou a grande anedota do corpo humano, como de um tipo de amável madeira serrada; discutiu gravemente se sua barba havia cometido traição; e, subindo as escadas, disse: “Veja como estou seguro cá em cima! Descer, posso fazê-lo sozinho.”

Mas Thomas Morus nunca desceu aquela escada. Ele havia terminado com todas as descidas e movimentos descendentes; e desapareceu aos olhos dos homens quase à maneira de seu Mestre, que, ao ser erguido, puxou todos os homens consigo. E encerrou-se a escuridão ao seu redor, e as nuvens se interpuseram, até que, muito tempo depois, a sabedoria capaz de ler tais segredos viu-o fixado muito acima de nossas cabeças, como uma estrela em regresso; e firmou seu lugar nos céus.

[1] A expressão “problem plays” faz referência a uma espécie de teatro realista do século XIX, que tem como traço característico o debate de problemas sociais que envolvem os personagens em complicados dilemas. Os mais famosos escritores de peças desse tipo foram Alexandre Dumas e Henrik Ibsen.

[2] “Leg-puller”seria, mais literalmente, aquele que, por brincadeira, “passa a perna” em outros.

Fonte:

CHESTERTON, G. K. São Thomas Morus. Site Chesterton Brasil. [Tradução de Luíza Monteiro de Castro Silva Dutra]. Disponível em: http://chestertonbrasil.blogspot.com/search/label/São%20Thomas%20Morus Acesso em: 23 Junho 2011.

terça-feira, 21 de junho de 2011

Ciência e Fé são incompatíveis?

Por: Karl Heinz Kienitz 

Nosso cotidiano é profundamente influenciado pela ciência. Percebemos isto ao atentar para o copo de água tratada que bebemos ou o telefone celular com o qual nos comunicamos. Mas a fé também tem profundo impacto em nossas vidas. Max Planck, pai da teoria quântica e ganhador do prêmio Nobel de Física de 1919, testemunha que “... desde a infância a fé firme e inabalável no Todo Poderoso e Todo Bondoso tem profundas raízes em mim. De certo seus caminhos não são nossos caminhos; mas a confiança nele nos ajuda a vencer as provações mais difíceis”. 1 A importância da fé também foi reconhecida pelo pintor impressionista Auguste Renoir, que ao comentar certas obras de grandes pintores disse: “Nas obras de antigos mestres jaz uma confiança suave, serena. Ela provém duma conduta despretensiosa, simples, que não existiria sem a fé religiosa como motivo primeiro. O homem moderno, porém, enxotou Deus -- e assim perdeu segurança”.

O “enxotar Deus”, como Renoir o expressou, é motivo para propagar um falso conflito entre fé e ciência. Este falso conflito é contundentemente denunciado pelo sociólogo Rodney Stark, que com base em pesquisas sólidas demonstra a inverdade e o forte viés ideológico de afirmações como: “Fé religiosa é uma manifestação primitiva que desaparece com o a difusão da ciência e tecnologia”, “Religião é oriunda de ilusões e neuroses” ou “Religião é, genericamente, instrumento de manipulação”2. Richard Feynman (prêmio Nobel de Física de 1965), embora não-cristão, concorda que “muitos cientistas creem na ciência e em Deus, o Deus da revelação, de uma forma perfeitamente consistente.”

De fato pode-se citar muitos cientistas que consistentemente combina(ra)m uma fé bíblica com uma atividade científica de ponta. Por falta de espaço irei citar apenas mais três.

Primeiro, André Marie Ampère, cujo nome ficou para sempre associado à unidade de corrente elétrica, e que recomenda: “Estude as coisas deste mundo, é tua profissão; mas olha-as apenas com um olho e fita o outro permanentemente na luz eterna... Escreva apenas com uma mão; com a outra te segura na veste de Deus assim como uma criança se segura na veste de seu pai”.

Em segundo lugar, Louis Pasteur, o grande microbiólogo francês do século XIX, entendia a busca pela verdade na ciência e na fé como inter-relacionadas e afirmou: “Proclamo Jesus como filho de Deus em nome da ciência. Meu espírito científico, que dá grande valor à relação entre causa e efeito, comprometeme a reconhecer que, se ele não o fosse, eu não mais saberia quem ele é... Suas palavras são divinas, sua vida é divina, e foi dito com razão que existem equações morais assim como existem equações matemáticas”.

O terceiro seria Arthur L. Schawlow, prêmio Nobel de Física de 1981, que disse: “... eu encontro uma necessidade por Deus no universo e em minha própria vida... Somos afortunados em termos a Bíblia, e especialmente o Novo Testamento, que nos fala sobre Deus em termos humanos muito acessíveis, embora também nos deixe algumas coisas difíceis de entender”.

No Novo Testamento, que nos fala de Deus e de sua manifestação visível em Jesus Cristo, o apóstolo Pedro diz: “Não seguimos fábulas engenhosamente inventadas, quando lhes falamos a respeito do poder e da vinda de nosso Senhor Jesus Cristo; pelo contrário, nós fomos testemunhas oculares da sua majestade.” (2 Pe 1.16) Esta preocupação com a autenticidade e a verdade é comum a todos os textos da Bíblia e torna sua mensagem compatível com a ciência praticada por cientistas como Ampère, Pasteur e Schawlow.

Notas:

1. As citações usadas neste artigo foram extraídas de J. Gutzwiller - Das Herz, etwas zu wagen, Friedrich Bahn Verlag, 2000 (ISBN 3761593031), exceto a citação de Feynman, que consta de H. Schaefer – Science and Christianity: Conflict or coherence? The Apollos Trust, 2003 (ISBN 097429750X), e a de Schawlow, proveniente de sua própria contribuição em H. Margenau, R.A. Varghese - Cosmos, bios, theos, Open Court, 1992 (ISBN 0812691865).

2. Dois artigos em que Rodney Stark e coautores discutem este assunto são: R. Stark - “False conflict,” The American Enterprise, pp. 27 - 33, outubro/novembro de 2003; R. Stark, L. R. Iannaccone, R. Fink - “Religion, science and rationality,” American Economic Review, vol. 86, número 2, pp. 433-437, maio de 1996.

sábado, 18 de junho de 2011

Pe. Paulo Ricardo explica “o poder paralelo dentro da Igreja”

Por. John Lennon J. da Silva

Caríssimos leitor(a)s passo a vocês este vídeo do Revmo. Pe. Paulo Ricardo de Azevedo Junior. Que em um de seus últimos programas de seu site, trabalho que ele chama de “parresia”. Manifestou-se com notáveis observações sobre uma das obras que a meu ver, é uma das que mais prejudicaram a fé católica e a Igreja no século XX.

Trata-se da Obra “Igreja: Carisma e poder” publicada em julho 1981, época em que Leonardo Boff ainda era Frei franciscano. Na obra o então frei desenvolve uma dialética de dualidade entre uma Igreja opressora e vilã e uma Igreja oprimida e escondida nos porões do mundo, esta última é mais inteiramente ligadas às questões sociais e têm seu núcleo central composto por leigos.

Pois, que o sistema hierárquico da Igreja é corruptor da verdade, ultrapassado antidemocratico. Sem mencionar também análise recheada de terminologias marxistas com roupagem católica, exemplo, “meios de produção religiosa”. Bem é missão do livro é nitidamente relativizar as funções docentes e discentes, conceito e relações na Igreja.

No Livro o autor entre as linhas da obra, começa pouco a pouco a induzir os que lêem uma transformação radical da Igreja, ao melhor, faz uma petição aos leigos para mudar este quadro, típica perspectiva do pensamento revolucionário. Tais posições ajudaram e muito a Teologia da Libertação que já em sua doutrinação, ou seja, em sua tentativa de contra-ataque a Igreja vilã detinha tais opções e mentalidade. A obra representou a visibilidade do pensamento esquerdista infiltrado na Igreja.

Na obra o Leonardo Boff o termo “eclesiogênese” para elaborar em sentido estrito uma “reinvenção da Igreja”, já que segundo ele a Instituição atual, esta malfada pelo tempo e pelas manipulações políticas e eclesiais ao longo dos séculos, Assim deve aparecer a “Igreja Carismática” em oposição a “Igreja Dominante”.

Em 1985 o então cardeal Ratzinger, hoje Bento XVI, que na época era prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé. Depois de examinar atentamente o livro a mesma Congregação o condenou. Chamou o Frei Leonardo Boff a Roma.

Por ocasião dos 30 anos desta obra, que traz a visão eclesiológica do Sr. Leonardo Boff seu estilo linguístico podemos dizer que é autoritário, caricatural, sarcástica. O Pe. Paulo Ricardo resolve abordá-la em um vídeo de mais de 30 minutos.

No vídeo abaixo intitulado “O poder paralelo dentro da Igreja” vocês poderão ter em vista alguns dos erros crassos e equívocos da análise rebuscada de marxismo e heresia que o Sr. Leonardo Boff apresenta nesta condenável obra.


quinta-feira, 16 de junho de 2011

A calça comprida desmerece e fere a modéstia?

“Certos homens odeiam a verdade, por amor daquilo que eles tomaram por verdadeiro”. “Não se imponha a verdade sem caridade, mas não se sacrifique a verdade em nome da caridade”.(Santo Agostinho).


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Por Melissa Bergonso

Algumas pessoas questionam sobre o uso da calça porque dizem que a Igreja não emitiu uma notificação clara sobre a vestimenta da mulher nos dias atuais. De fato, não há uma “normativa oficial” da Igreja quanto aos trajes femininos, mas para o bom cristão, que quer agradar ao máximo a Deus e rejeitar, a todo custo, o pecado e o que pode ser ocasião de pecado para si ou para o próximo, não é necessário normas explícitas, pois as virtudes, a boa índole e a santidade é algo que todos nós temos que buscar, ter e querer sempre.

Toda mulher deve procurar vestir aquilo que mais a torna semelhante à Mãe de Deus, pois Ela é nosso modelo supremo de virtude e perfeição feminina. Vamos parar e pensar: qual peça de roupa propicia a uma mulher ficar semelhante à Virgem Pura? A calça é que não é, independente do modelo e estilo. Muito menos vestidos curtos e decotados. Dizer que há calças e “calças” é falácia. A calça, por si só, delineia o corpo feminino nas partes que mais são atrativas aos homens: bumbum, quadril e pernas. Mesmo as calças folgadas delineiam bumbum e quadril, que são partes que atraem a vista masculina. Vestidos decotados e curtos nem merecem comentários. Uma mulher que preze pela modéstia e por imitar Nossa Senhora não os usa de modo algum.

Como já abordei no artigo Roupas Femininas » Modéstia e Comprimento - e também várias pessoas que estudam sobre modéstia dizem a mesma coisa - para uma roupa ser considerada efetivamente modesta ela deve obedecer as seguintes “regrinhas”:

1) Roupas verdadeiramente modestas devem cobrir nossa pele e esconder nossa forma.

2) Roupas femininas DEVEM SER FEMININAS, observando sempre a regra número 1.

3) Roupas modestas femininas devem proporcionar total liberdade de movimento sem expor as partes íntimas do corpo aos olhares alheios.

Dizer também que a Igreja nunca se pronunciou sobre modéstia é mentira. Pode não haver uma “norma oficial”, porém existem vários documentos de Papas e Cardeias, os quais listei no artigo referenciado acima.

Muitas mulheres católicas por frouxidão e comodidade não aceitam as palavras que são das próprias autoridades eclesiásticas sob o pretexto que isso foi para determinada época. Isso é ridículo, porque ensinamento sobre moral não é para determinada época, é para todo o sempre, pois a moral não muda, muito menos o significado de modéstia. O que mudam são opiniões e gostos pessoais, que podem ou não estar de acordo com os ensinamentos da Santa Igreja (e que é péssimo se não estiverem).

Quem “acha” que o uso da calça comprida por uma mulher não é má em si, é porque ainda não entendeu o princípio que rege a moda sensual atual. Quem acha, não tem certeza, e eu tenho certeza que a calça não é uma vestimenta que propicia a modéstia feminina. Por isso, discordo sobre que “a calça feminina não desmerece a modéstia nem causa vergonha a quem usa”. A calça comprida, na mulher, desmerece a modéstia sim, pois afasta sua imagem feminina da Imagem da Santíssima Virgem Maria. Pode não causar vergonha a quem não compreende como uma calça pode ferir a modéstia e desagradar Nosso Senhor, mas quem compreende isso tem vergonha sim ao vestir uma calça. Posso afirmar isso porque eu mesma já usei calças até uns anos atrás. Graças a Deus, quanto mais aprendo sobre modéstia, pureza, castidade, busca pelas virtudes e pela santidade, mais eu me afasto das roupas que ferem ou podem ferir qualquer um desses pontos. Hoje, se tivesse que usar uma calça comprida, sentiria sim vergonha, porque sei que estaria ferindo a modéstia, que tanto agrada a Deus e que tanto nos torna (a nós mulheres) semelhantes à Virgem Pura Imaculada, e poderia estar sendo causa de queda e de pecado para outra pessoa. Essas justificativas me bastam para ter vergonha de usar calças compridas, além de dar paz ao meu coração por tê-las abolido da minha vida completa e definitivamente.

JEANS: REBELDE E SENSUAL

Também engana-se quem pensa que o jeans não fere a modéstia. Não existe jeans que seja conveniente à modéstia. Qual jeans não revela a forma de uma mulher? Ou não a masculiniza? Se a mulher perde a feminilidade, ela perde sua essência. Deus fez o homem masculino, viril, e a mulher feminina, delicada. São diferentes, mas complementares. Deus quis isso, e isso é bom.

O jeans, na história, está em sua maior parte relacionado à rebeldia. No site Portais da Moda podemos encontrar o seguinte parágrafo:

O denim atravessou o século XX, se transformando no artigo de moda mais democrático e popular existente. Na década de 40, os cowboys do asfalto montavam suas motos Harley-Davidson trajando o jeans. Mas foi na década de 50 que o jeans se transformou em símbolo de rebeldia, quando, no filme Juventude Transviada, o ator James Dean, no papel do jovem e rebelde Jim Stark, apareceu usando a combinação clássica: calça jeans e camiseta branca. Além de Dean, Marlon Brando e Elvis Presley contribuíram para que o artigo se disseminasse entre os jovens da época, que teve sua imagem intrinsecamente ao rock. A imagem rebelde do jeans se tornou tão forte, que o traje passou a ser proibido nas escolas e em lugares como cinemas e restaurantes. Logo depois, novas modelos, como Marylin Monroe, usavam o jeans com um apelo sensual.[1]

Como podemos ver, o jeans foi adotado pela juventude rebelde como “bandeira”, como “auto afirmação de imagem”, e usado pelas novas modelos com intenção de apelo sensual. Segundo ainda a mesma fonte da citação acima, o jeans brasileiro é bem cortado e arrebita o bumbum. Por este motivo ele promove a sensualidade, a valorização do corpo e o ajuste perfeito das calças.

A explosão do nosso jeans se deve as famosas que procuram a sensualidade, a valorização do corpo e o ajuste perfeito das calças aqui produzidas. Artista como Alanis Morissette, Christina Aguilera, Meg Ryan, Jennifer Lopez e Britney Spears foram as primeiras a circular com marcas brasileiras como a Gang, Forum, Zoomp, Ellus e M Officer no exterior.[2]

Pode uma roupa que tem o propósito de favorecer, propiciar e enfatizar a sensualidade e modelação perfeita do corpo ser peça adequada para uma mulher que busca a modéstia de Nossa Senhora? Com certeza não. E não adianta bater o pé (aos defensores de plantão), qualquer jeans busca isso.

No site Manequim ainda temos:

O nome “jeans” passou a ser usado na década de 1940, nos Estados Unidos, para designar calças de brim índigo blue, que nesse momento já dava os primeiros passos para virar uniforme da juventude. O termo é uma corruptela do francês Gênes (Gênova), cidade portuária italiana onde os marinheiros usavam calças de sarja grossa proveniente de Nîmes - outro nome que sofreu alteração para dar origem ao termo denim, que virou sinônimo de tecido para fazer calça jeans[3].

O “uniforme” da juventude virou uniforme de homens, mulheres e crianças. Chegamos ao ponto de hoje olharmos na rua e identificarmos pelo menos 90% das pessoas usando jeans e camiseta. Não se sabe nem mesmo quem é leigo e quem é padre hoje em dia pelo “igualitarismo de vestimenta” (já que muitos religiosos e mesmo sacerdotes gostam de usar roupa secular ao invés do hábito, batina ou clergyman). Outras vezes não conseguimos nem mesmo identificar quem é homem e quem é mulher dependendo do “modelito” que ambos usam, pertencente à tão aclamada moda “unisex” de hoje em dia, pois de costas quase que ficam idênticos, quase andróginos (quando não parecem de fato). Essa “androginia”, de uma forma ou de outra, tira a ordem, a diferença e a hierarquia natural que Deus quis e desejou para ambos, homem e mulher. Deus criou o homem e a mulher não para serem iguais, mas justamente para que sendo diferentes se completassem naquilo que lhes falta. Assim se dá o crescimento humano e espiritual. Ninguém cresce e aprende se for exatamente igual ao outro.

QUANDO O USO DA CALÇA É “TOLERADO”

Uma mulher, em determinados trabalhos e situações, talvez necessite realmente vestir-se com uma calça comprida, por questões de segurança, como é o caso de mulheres que trabalham em setor industrial, em meio à maquinários e equipamentos perigosos. Mas isso não é regra, é exceção, e não a justifica vestir-se como o mundo impõe e a moda ensina. O mundo ensina coisas que não agradam a Deus, pois o príncipe do mundo é satanás. A moda não foge à regra. Qual moda veio em favor da modéstia? Quase nenhuma, pois a maioria vem a favor da sensualização, erotização e degradação feminina.

Por esses motivos é que o Santo Padre Pio escorraçava as mulheres que iam confessar-se com ele vestidas com calças compridas. Se a calça não ferisse a modéstia ou não a desmerecesse, com certeza Padre Pio não diria nada, muito menos seria tão ferrenho nas repreensões e conselhos sobre isso. Não é à toa que na porta da Igreja dele foi posto um cartaz com a seguinte recomendação:

“A Igreja é a casa de Deus. É proibido para os homens entrar com os braços nus ou usando shorts. É proibido para as mulheres entrarem usando calças, sem um véu sobre sua cabeça, com roupas curtas, decotes baixos, roupas sem mangas ou vestidos imodestos”.[4]

Portanto, se a mulher REALMENTE necessita usar calças compridas por motivo de segurança e saúde NO TRABALHO, que use calças folgadas, amplas e compridas, não essas calças de última moda ou de corte reto e justo que colam ao corpo, evidenciam as formas femininas e marcam a roupa íntima.

MODA E VIRTUDE: BEM DA ALMA SOBRE O BEM DO CORPO

O Papa Pio XII[5], em uma de suas Alocuções às Garotas da Ação Católica, deixou bem claro que:

Mesmo seguindo a moda, a virtude está no meio. Aquilo que Deus pede é recordar sempre que a moda não é, nem pode ser a regra suprema da conduta; que acima da moda e de suas exigências existem leis mais altas e imperiosas, princípios superiores e imutáveis, que em nenhum caso podem ser sacrificados ao talante do prazer ou do capricho, e diante dos quais o ídolo da moda deve saber inclinar a sua fugaz onipotência. Esses princípios foram proclamados por Deus, pela Igreja, pelos santos e pelas santas, pela razão e pela moral cristãs, assinalados limites, além dos quais não florescem lírios e rosas, nem pairam nuvens de perfumes da pureza, da modéstia, do decoro e da honra feminina, mas aspira-se e domina um ar malsão de leviandade, de linguagem dúbia, de vaidade audaz, de vanglória, não menos de espírito que de traje. São aqueles princípios que Santo Tomás mostra para o ornamento feminino e recorda, quando ensina qual deve ser a ordem de nossa caridade, de nossas afeições: o bem da própria alma deve preceder o do nosso corpo, e à vantagem de nosso próprio corpo devemos preferir o bem da alma de nosso próximo. Não se vê, portanto, que há um limite que nenhuma idealizadora de modas pode fazer ultrapassar, a saber, aquele além do qual a moda se torna mãe de ruína para a alma própria e dos outros?

Algumas jovens dirão talvez que uma determinada forma de vestuário é mais cômoda, e também mais higiênica; mas, se constitui para a saúde da alma um perigo grave e próximo, não é certamente higiênica para o espírito: tem-se o dever de renunciar. A salvação da alma fez heroínas mártires como Inês e Cecília, em meio dos tormentos e lacerações de seus corpos virginais: e não irão vocês, suas irmãs na fé, no amor de Cristo, na estima para virtude, encontrar no fundo de seus corações a coragem e força para sacrificar um pouco do bem-estar - uma vantagem física, se vocês preferem - para conservar segura e pura a vida de suas almas?

Que Cristo, Nosso Senhor, guie nossas almas e nossos corações na busca da santidade.

Seja a Virgem Pura nosso modelo de Fé, Pureza e Bravura.

Virgem Puríssima, Modelo dos Cristãos, Rogai por nós!

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[1] Cf. Portais da Moda: A História do Jeans

[2] Cf. Portais da Moda: A História do Jeans

[3] Cf. Manequim: A História do Jeans

[4] Bishop Bernard Fellay. The Dignity of Women: The Misplaced Notions of Feminism.

[5] Alocução às Garotas da Ação Católica: Cruzada pela Pureza.
Fonte:

BERGONSO, Melissa. A calça comprida desmerece fere a modéstia? Blog Mulher Católica. Disponível em: http://www.mulhercatolica.org/2010/07/calca-comprida-desmerece-e-fere.html Acesso em: 16 Junho 2011.

terça-feira, 14 de junho de 2011

Testemunho de Jonadabe Santos Rios - ex-protestante

Meu nome é Jonadabe Santos Rios* tenho 20 anos. Sou de Feira de Santana/BA, e nasci em uma família protestante. Todos, seja por parte de minha mãe e de meu Pai, são protestantes. Meu Pai é pastor da Igreja Missionária Quadrangular, da qual fundou várias na Bahia. Outros tios são de um "ramo" da Batista, e da Quadrangular (Igreja do Evangelho Quadrangular). É claro que ambos não concordam doutrinariamente entre si, como deve ser a Igreja, só concordam que eu devo estar equivocado. Bom, o melhor é que eles entrem em algum consenso antes de me dizerem que estou equivocado e tentem me fazer voltar à babel teológica que é o Protestantismo.

Quero contar uma parábola que reflete o que aconteceu e está acontecendo com a Igreja de Cristo. É a estória de um Rei Eterno que decidiu edificar um belo castelo para sua morada e de sua família, que seria qualquer um que o amasse e decidisse viver com ele. De forma que quem morasse em seu edifício, no tempo determinado por esse Rei Eterno, também viveria com suas palavras de vida eterna.

Ele edificou a pedra fundamental, as colunas e todas as partes do castelo. Da ponte às janelas; do quarto ao banheiro. Todas as partes eram necessárias para formar um castelo segundo sua vontade. Esse Rei teve que viajar, mas instituiu servos para o representar, cada um com uma função, e um líder geral de sua confiança para que eles andassem sempre unidos. A prometida vida seria vivida de uma vez por todas assim que voltasse.

O Rei demorou em sua viagem, de forma que com o passar do tempo seu castelo tornou-se sujo, até mesmo alguns lideres gerais cometeram certos erros. Mas o castelo não estava abandonado, pois hora ou outra apareciam moradores zelosos. Estes o pintavam e concertavam lugares danificados.

Todos eles recitavam os ensinos do Rei no seu dia a dia de forma oral. Os professores ensinavam aos alunos utilizando também alguns livros, pois eles eram úteis. Esses livros não eram suficientes pra explicar tudo, já que sempre surgem falsas interpretações de leitores desavisados. Por isso o ensino instituído pelo Rei era feito por pessoas autorizadas, que inclusive fizeram uma lista dos livros científicos. Isso eles chamavam de tradição real.

Passados centenas de anos, começaram a surgir moradores que diziam entender de construção e do verdadeiro conhecimento real. Segundo eles, o castelo não deveria ter janelas daquela forma, e a cor não combinava com uma realeza. “A porta está muito estreita”, afirmavam alguns. “Pra que tantas colunas?”, perguntavam outros. Nem mesmo os livros da biblioteca desse Rei, incluindo os livros científicos, feitas por escritores que o presenciaram, foram respeitados. Eles alegavam entender mais do que os próprios lideres instituídos pelo Rei! Acontece que, por obra do inimigo do rei, cada um se intitulou um reformador da casa (mas na verdade agiam na maioria das vezes como deformadores).

“Não combina com a realeza!”, era seu brado. “Vamos reformar a casa, assim que o Rei voltar, vai ver que fizemos a sua vontade”, “destruiremos estes fundamentos de falsos construtores e instituiremos os nossos próprios e verdadeiros fundamentos”. Mas eles não quiseram reformá-la da mesma forma que os outros servos zelosos. Eles desejaram um castelo segundo suas vontades. Pegaram machados e marretas; bombas e pedras. Tentavam demolir o castelo, mesmo discordando um do outro.

Um aceitava a janela, pois não gostava da luz do sol que batia na sala, por isso a apedrejou. Outro concordava que deveria ter janelas, para deixar o ar arejado. Mas todos concordavam que deveriam reconstruir a casa e destituir o líder instituído pelo Rei. Cada um deveria ser seu próprio líder. O problema é que cada um tentava fazer tudo segundo a sua própria vontade, por meio de divisões e mais divisões de grupos de reformadores.

Acabou que cada reformador decidiu montar seu barraco ou castelo de areia, e boa parte deles eram fora dos limites do castelo. Começou a surgir, então, vários conjuntos de barracos e castelos de areia, um do lado do outro, alguns isolados de tudo. Tinham até os sem telhado! Ou os sem barraco, pois concluíram que só seu corpo basta, e seu corpo é o castelo (ignorando todo o fundamento posto pelo Rei). Esses gostavam sempre de criar discussões para provar que fazer discussões sobre o que o Rei disse ou não é infantil, instituindo que o Rei não havia instituído nada além o que eles instituem. Assim, tentavam provar que não importa provar nada. Tinha alguns barracos dentro dos limites do castelo (afinal, até mesmo na Babilônia existem os exilados de Israel). Mas todos estes foram enganados por alguns reformadores enganados por outros que foram enganados pelo inimigo do Rei, um rei de outra província chamado Narciso. Interessante é que depois de chamar o Castelo como uma casa do demônio, cada mini construtor desses barracos, castelos de areia ou peregrinos sem casa, começou a chamar um ao outro de seguidor do demônio. Destruída as bases do castelo, de fato qualquer um poderia dizer isso e encontrar alguma forma para se justificar.

Muitos moradores do castelo foram convencidos pelos barraqueiros entrar no conjunto de barracas. Mas sempre existiam os que voltavam para seu verdadeiro lar: o Castelo Real. Mas os verdadeiros moradores zelosos, construtores autorizados de fato pelo Rei, trataram de concertar o estrago feito pelos autointitulados reformadores. Alguns eram sinceros, mas sinceramente enganados.

O Rei ainda não voltou, entretanto o castelo real continua de pé e segundo a vontade do Rei. Mesmo com algumas falhas na pintura, mas sempre repintada da cor original nas partes falhas. Este castelo continua firme e forte, afinal, o próprio Rei Eterno prometeu que estaria com eles até a consumação do século e que as investidas dos bárbaros não prevaleceriam contra seu castelo. Infelizmente ainda há os que se alimentam dos mitos criados em relação ao castelo. Os mesmos acabam perdendo os tesouros dados de graça pelo Rei.

Seus moradores zelosos continuam a trabalhar, principalmente trazendo de volta estas pessoas enganadas. Cada vez mais os filhos do Rei Eterno voltam pra casa, ora avaliando seus próprios erros de construção, ora sendo convencidos por outros. Ambos esperam a volta do Rei e a revelação geral do seu reino.

A Igreja, assim como o castelo, continua firme, mesmo com as tempestades e pedradas, pois, como nosso Rei Eterno Jesus prometeu as portas do inferno não prevalecerão contra a sua Igreja (cf. Mt 16,18). A Santa e Una Igreja Católica. Os mitos devem ser desfeitos, e os fundamentos reais reafirmados. Que o Rei envie cada vez mais trabalhadores zelosos para sua obra.

Mas por que me tornei católico? Uma das várias razões que me fez deixar o protestantismo é que suas bases não fazem sentido em si mesmas sem a tradição da Igreja. Além disso, observando as doutrinas católicas, vi que são mais bíblicas que algumas doutrinas protestantes. Se é que podemos dizer “algumas” desses vários ramos do protestantismo que surgem a cada dia com uma novidade primitiva. Se é ainda, que algo pode ser chamado de novidade (como uma nova revelação) e ao mesmo tempo ser primitiva!

Isso se deu principalmente quando comecei a estudar a igreja primitiva e a doutrina católica bem como a sua história, e percebi, assim como vários ex-protestantes, que os primeiros cristãos eram mais católicos que protestantes, também que as pessoas criaram vários mitos em relação ao catolicismo. Os mesmos mitos direcionados ao Castelo Real. Assim como o Castelo, a Igreja não foi modificada posteriormente por homens que queriam que os outros acreditassem em suas doutrinas humanas. Houve sim um desenvolvimento na forma de compreender as mensagens de Jesus, dos apóstolos e dos cristãos primitivos. Não um desenvolvimento no sentido de que algo diferente e até mesmo contraditório era acrescentado, mas um desenvolvimento na medida em que os cristãos começavam a meditar no depósito da fé, na Tradição e Escrituras, guiados pelo Espírito Santo, conforme Jesus prometera. Ao contrário do mito inventado por alguns supostos reformadores, nem o Castelo nem a Igreja escondiam os livros sagrados, ou proibiam a leitura de sua biblioteca. Na verdade foram ambos que preservaram seus livros, além de que, por meio de pessoas autorizadas, pois sucederam as colunas do Castelo e da Igreja e foram guiados pelo Espírito, que sabemos quais são os livros que de fato revelam a vontade do Rei. Da mesma forma que os moradores do castelo, os católicos adoram somente a seu Deus, mas, como foram ensinados desde o principio, prestam honras aos que seguiram de forma exemplar os mandamentos de seu Mestre.

Não pretendo fazer aqui nesse testemunho uma analise dos pontos principais que me fizeram católico. Quero é convidar as pessoas sinceras, principalmente protestantes, a buscarem a verdade a respeito da Igreja Católica. É certo que várias pessoas preferem criticar a Igreja com coisas simplesmente ridículas, como o uso de crucifixos (sim, ainda tem gente que critica isso!), mas só o fato de estar lendo esse texto, caso não seja católico, já indica disposição em examinar as evidências católicas.

Sobre a reforma protestante, penso que houve pouca comunicação de ambas as partes. Se hoje, com todos os meios de comunicação disponíveis, ainda há mitos alimentados e falta de comunicação, e até mesmo desonestidade por parte de alguns, imagine quando a imprensa nascia? Hoje, graças a Deus, vários desses mitos estão sendo desfeitos, não só mitos em relação a Igreja, mas de “reformadores” que foram transformados em mitos, em príncipes da liberdade de expressão e religiosa, quando na verdade não foram. Interessante é que as catacumbas de Roma, que nos dão inumeras e fortes evidencias da crença primitiva (principalmente das contrárias ao ensino protestante) foram redescobertas em uma época muito próxima em que as controvérsias protestantes estavam em alta. Supeito uma providência Divina nessa redescoberta. Será o Rei Eterno dando sinais de sua presença invisível?

Nunca imaginaria que iria encontrar a ortodoxia na Igreja Católica. Como certa vez disse G. K. Chesterton, “Tentei criar uma nova heresia; mas, quando já lhe aplicava os últimos remates, descobri que era apenas a ortodoxia.”. O mesmo bem afirmou que para se conhecer de fato o cristianismo ou tem que estar totalmente dentro dele, de forma que o conheça, ou totalmente fora a ponto de não odiar. Como uma casa que, se ficarem somente na entrada não se conhecerá a beleza vista de fora nem as maravilhas internas. Deve-se ou entrar dentro da casa, ou sair totalmente fora dela para vê-la por completo. A mesma coisa se pode dizer sobre a Igreja Católica.

No mesmo livro (O Homem Eterno), esse grande católico afirmou uma verdade que se vê em toda a história da Igreja: quando se pensa que a Igreja morreu, aí é que ela nasce de novo, isso porque tem um Deus que sabe morrer e voltar a vida. Quando Jesus morreu, todos pensaram que o seu movimento havia cessado, mas o que aconteceu foi exatamente o contrário. Seus discípulos pregavam que o Cristo havia ressuscitado dos mortos. E quando os imperadores pensavam que iriam destruir a Igreja do Senhor cortando seu corpo em pedaços, aí é que ela revivia e se revigorava a cada mártir que tinha seu corpo queimado, esquartejado ou jogado às feras. Ou, a exemplo de Chesterton, no tempo em que o imperador, filho de Constantino, desejava que a Igreja acreditasse na nova moda que era o arianismo, mas a crença de que Jesus é o Filho Eterno de Deus tornou-se novamente viva entre o povo por causa dos que mantinham essa chama acesa. Depois da reforma pensou-se que a Igreja, o barco que anda (mesmo que às vezes vacilante) no meio das águas mundiais com todas essas crenças divergentes, iria afundar e acabar sendo um barco entre as canoas que haviam afundado, ela continua firme e forte com o Vigário de Cristo nos guiando pela ajuda do Cristo que ainda não está presente de forma física. Hoje com muitos dos ditos católicos agindo como se não o fossem, ainda há um povo guiado por Jesus Cristo sendo levantado. Muitos estão gritando que a Igreja está morta, assim como seu Cristo que morreu. Mal sabem que o Cristo que soube fazer essa Igreja reviver nos tempos em que parecia desfalecer, está a levantar novamente seu corpo visível.

Sou um dos que nasceram dentro dos limites do Castelo, e, por isso, sempre fui católico. Da mesma forma que vários dos que são católicos mesmo sem saber. Mas criticava o catolicismo, pois não conhecia de perto. Eu o via por partes, e só concordava com essas partes que conseguia ver por completo, as outras, que via de relance, ou que alguns que afirmavam estar lá dentro (mas que nunca estiveram de fato) me diziam, eu descartava como algo que não é da vontade do Rei e assim preferia ficar ao redor do castelo.

Mas, por vontade de conhecê-lo de fato, depois de ver o exemplo de vida de alguns irmãos Católicos, comecei a entrar pela porta, e, por curiosidade, vasculhar as salas, os quartos, quadros e relíquias. Assim pude perceber a beleza e veracidade do depósito da fé pura revelada por Jesus e repassada pelos apóstolos e seus sucessores. Acabei ficando por lá mesmo, em um quarto que já estava preparado para mim antes mesmo de pensar em entrar. Vários quartos já estão preparados.
Como qualquer cristão, ainda há várias lutas para enfrentar, principalmente agora quando meus amigos e familiares me perguntam por que agora sou católico. Há luta também dentro de casa. Como é que um pastor evangélico pode se conformar que seu filho tenha se tornado católico? Bom, tenho que agradar a Deus e não aos homens, e tenho a fé de que ele vai ser mais um a testemunhar sua ida a Igreja de Cristo.
Não sou pessimista sobre esse assunto. Jesus me "otimizou", afinal, as portas do inferno não prevalecerão contra sua Igreja, e sinto que os tempos da Igreja estão a mudar. Cada vez mais a verdade está ficando clara com o protestantismo entrando em colapso consigo mesmo. Que todos sejam um, para que o mundo creia que nosso Senhor Jesus Cristo foi enviado pelo Pai (cf. João 17,21).
*Cedido carinhosamente pelo autor.