quarta-feira, 23 de janeiro de 2013

A Imitação de Maria - Parte I


Por: Eduardo Moreira

Na Igreja há um coração cheio de ternura, um coração amável e puro. Na Igreja há um coração que é só amor, um coração que espera a volta dos filhos. Esse coração é ao mesmo tempo o Coração de Maria e o Coração da Igreja, o próprio Corpo de Cristo. Nesse coração não há rancor, só espera. E quanta saudade tem sentido esse coração de seus filhos separados, sejam pela heresia, sejam pela tibieza e tepor do espírito.
Quantos espíritos vazios existem nesse mundo. Quantas pessoas ocas, presas em seu orgulho que não as deixa se renderem à doçura e ao amor infinito desse coração. Sagrado Coração de Cristo presente na Igreja, seu Corpo Místico, através da qual pelas mãos dos Sacerdotes Cristo vem a nós na forma de Pão e Vinho. O Imaculado Coração de Maria, doce, compreensivo e cheio de ternura. Um coração de Mãe, com ternura e amor de Mãe. Se Deus disse, quando partiu desse mundo para os Céus, que não nos deixaria órfãos, em parte o disse por causa do Espírito que enviou e em parte disse por causa de sua própria Mãe, a quem deu a São João e a toda a humanidade na cruz. A Igreja pequena e nascente precisava ser nutrida por uma Mãe humana. A Igreja era um bebê e Deus preparou Maria para continuar sendo sua Mãe, Mãe do Corpo Místico de Cristo. Por graça, Maria se tornou mãe de todos os cristãos que pelo batismo se tornaram filhos de Deus e filhos de Maria.
Quantas almas poderiam ter sido salvas se tivessem recorrido a esse amor. Quantos espíritos não estariam ocos se tivessem se dissolvido nesse mar de ternura. Quantas pessoas se matam, diariamente, por não suportarem o peso de viver sem a graça, sem a presença e ternura de Nossa Senhora, Mãe de Deus e da Igreja, caule de todas as Graças que jorram da raiz que é Deus. Quanta dor, quanto sofrimento poderia ter sido evitado se essas pessoas tivessem se deixado inflamar por esse amor até se extinguirem.
Inflamados pelo fogo de Cristo e sustentados pelo amor de Maria, essas almas teriam sido aniquiladas, teriam ficado rendidas a esse amor. Essas almas teriam se dissolvido no Infinito, teriam se tornado parte íntima do Corpo de Cristo e teriam ficado repletas de Deus. Quanta felicidade teriam tido se tivessem descoberto a santidade.
O Coração da Igreja e o Coração de Maria gritam de amores pelos homens, os vermezinhos e miseráveis pecadores. Poderiam, com justa razão, dizer “voltem seus vermes” ou ainda, “voltem, fragmentos de lixo”. Entretanto, Deus, ao olhar para nós mesmo sabendo de nossos pecados, só vê beleza. Deus odeia nossos pecados, mas nos ama com amor incondicional e deu a Maria a última e eterna missão de nos amar com semelhante amor. Se temos por certo que no Céu temos um pai, temos que ter por certo, de igual forma, que no Céu temos também uma Mãe. Essa Mãe, junto a Cristo na cruz, em seus últimos brados de um amor incondicional não nos rebaixa. Essa Mãe nos eleva à condição de filhos de Deus e ao invés de nos chamar do que merecemos, com muita saudade de nós diz: filhinhos, voltem para a Casa do Pai.
Filhinhos: um adjetivo bem apropriado para a forma como Maria, a mais perfeita criatura, nos enxerga. Um adjetivo que nos dá a qualidade de filhos, mas de filhos pequenos, ignorantes, muitas vezes soberbos e orgulhosos. Pelos nossos feitos e pelas nossas ofensas não merecemos nada mais que o castigo e a cólera de Deus.
Quão ousado é o homem ao pecar contra Deus. Quão estúpido é o homem, em toda sua pequenez e insignificância, ousar se opor a Deus, a desafiá-lo, a desobedece-lo e (sic!) a tentar ofendê-lo. Sim, digo a tentar porque por mais que queira o homem jamais poderá tirar a glória de Deus. Não se diminui, por mais que se queira, o infinito. É como uma formiga que inutilmente pinça uma barra de ferro pensando ser capaz de, com sua força, destruí-la.
Se soubéssemos quão graves são nossas ofensas, como expôs o grande doutor, Santo Anselmo de Cantuária, não cairíamos tão facilmente. Se soubéssemos o quão horrendo é o pecado, nos atiraríamos nesse foço de misericórdia que é Nossa Senhora e de lá não sairíamos. Teríamos horror ao pensar nos pecados e jamais teríamos coragem de cometê-los. Entretanto, o pecado gerou no homem a concupiscência e a iniquidade. Quando falo em concupiscência, não uso o sentido estrito da palavra. Quando falo em concupiscência quero dizer que o homem criou um apetite pelo pecado e com a iniquidade e o orgulho, criou uma perversidade tamanha que o impede de ver o número e a gravidade de seus erros.
O homem não consegue ter as dimensões de seus erros e por isso não recorre a esse amor. Só com uma vida de oração profunda e com profundo amor a Maria é que o homem pode ter, de forma bem torpe e pueril a dimensão de seus pecados. Muito é necessária a vida de oração. A oração é mais importante que a ciência. A ciência incha, embora seja boa porque é dom de Deus, mas a oração nos diminui, nos faz ter contato com Deus e faz com que conheçamos nossa imensa pequenez junto a esse Infinito Deus.
Maria não é, pois, superior ao Altíssimo. Ela é apenas um reflexo, uma luz pequena do Grandioso e Bondoso Deus. Entretanto, justamente por termos a concupiscência, a luz de Deus nos cega. É necessário, pois um filtro manso, puro e humilde, plenamente humano, para que possamos olhar a luz. Maria filtra a luz de Deus tal qual a lua filtra a luz do sol. Ninguém jamais pôde olhar para o sol com os olhos despidos, mas todos podemos olhar e admirar o esplendor da lua sabendo, pois, que esse esplendor não é dela, mas do sol. A lua, por mais que queira não tira o brilho do sol. Maria não quer tirar a glória de Deus, mas como boa mãe que é, nos permite olhar de forma mais perfeita para essa grandiosa e ofuscante luz.
Quem é, pois, o homem, ignóbil tal qual é, para recusar esse filtro? Que tipo de soberba, que tipo de orgulho tem o homem para pensar-se suficientemente grande para olhar diretamente para Deus? Só mesmo Aquela a quem Deus santificou e criou sem mácula pode fazê-lo. Não sem razão os pagãos erraram tanto, chegando a adorar a natureza e a sacrificar seus filhos aos ídolos. Não sem razão há tanto radicalismo e tantos excessos fora da Igreja. Quando o homem se atreve a olhar para a luz de Deus sem passar por Maria, essa luz lhe ofusca e lhe confunde. Discorre desse ato de orgulho toda a sorte de puritanismos, farisaísmos, idolatrias e divisões. Ninguém pode contemplar Deus diretamente, tanto que Deus fez-se homem para elevar o homem à sua dignidade. Mesmo o Deus feito homem, quando expunha um pouco de sua Sabedoria colocava os homens ao escabelo. Quantas passagens ininteligíveis existem nos Evangelhos. É necessário, pois, que recorramos a Maria, a mais perfeita criatura, mais pura que os anjos de Deus nos céus, Aquela a quem o próprio Arcanjo São Gabriel chamou “Graça em Plenitude”.
Maria, concebida sem pecado como era, entretanto, poderia ter pecado caso quisesse. O fato de ser Imaculada não lhe tirou o livre arbítrio. Eva também era imaculada, foi tecida sem o pecado original. Entretanto, mesmo sem ter o pecado original, Eva sucumbiu às tentações de sua carne e pecou contra Deus, desgraçando toda sua descendência. Maria é a nova Eva. É a nova Eva porque Deus quis dar ao homem uma nova chance. Deus criou uma nova mulher Imaculada pela graça, por antecipação do Sacrifício de Cristo. É como se Maria tivesse sido batizada antes mesmo de nascer, pois foi já concebida sem pecado. Entretanto, a inteligência não alcança tão grande mistério de forma que é simplista dizer com certeza que a Imaculada Conceição é fruto de um batismo antecipado. A Imaculada Conceição foi a antecipação da Graça pela obediência certa de Jesus Cristo. Isso é possível porque pra Deus o tempo não existe, afinal, Deus é eterno.
Ao criar Maria, a Nova Eva, Deus deu uma nova chance ao homem. Criou outra Virgem Imaculada esperando outra resposta do homem. Maria, se quisesse e com muito mais razão, teria pecado, afinal o mundo já se encontrava totalmente distinto do mundo que Eva encontrou. O mundo estava marcadamente corrompido. Entretanto, Maria em suas orações e em sua simplicidade permaneceu sem pecado até sua morte, não por destino, mas por seu desejo e pela Graça de Deus que a auxiliou nesse propósito.
De fato, Deus não moldaria seu Filho, Jesus Cristo, em um ventre impuro. Certamente Maria passou por dificuldades, mas não possuía a iniquidade ou a concupiscência. Maria conhecia a gravidade do pecado, muito embora não o conhecesse. Maria não deixou de pecar por medo do Inferno, mas por amor a Deus. Isso fez de Maria a maior das doutoras, colocando mesmo os grandes doutores Santo Agostinho de Hipona e Santo Tomás de Aquino sob a planta de seus pés. São Luís Maria Grignion de Montfort com muita razão diz que um gesto simples do dia a dia de Maria foi mais grandioso que o martírio de Santo Estêvão, que se deu em meio às brasas. Maria era tão pura que aplicava amor total em todas as suas ações de forma tal que criava a perfeição, com a graça de Deus, mesmo nas coisas simples da vida. Santo Estêvão, por mais santo que tenha sido, jamais pôde ser chamado perfeito. Maria, ao contrário, foi chamada graça em plenitude (gratia plena) não pelos homens, mas pelos anjos de Deus e sem exagero algum. De fato, de Gênesis à Apocalipse não há, em nenhum momento, uma saudação similar àquela que foi dada à Mãe de Deus.
Também Santa Isabel, a bendita idosa que concebeu o profeta que precedeu Cristo, chamou Maria de “Mãe do meu Senhor” e mesmo sendo santa e com um ente santo em seu ventre, Santa Isabel se viu indigna de receber tão importante visita, a visita da mãe de Deus.
Se um anjo declarou que Maria era cheia de Deus, como diz a canção, quem somos nós para não o dizer também? Quem somos nós para que Deus se preocupe em nos deixar uma Mãe? Não merecemos o amor de Deus, antes merecemos sua cólera.
Assim mesmo, tendo todos os nossos pecados, Deus, através de sua mãe Maria Santíssima está a dizer: Filhinhos, voltem para a casa. É um apelo incessante que se dá não por necessidade de Deus, porque Ele não precisa de nada, mas sim pelo amor que Ele tem por nós. E quantos corações Deus espera, todos os dias, nos sacrários da Igreja através do Corpo e do Sangue de Cristo, dos quais jorram bicas de misericórdia e de amor. Quantas vezes Deus nos chama, sem cessar, voltem para a casa. Se o pulsar do coração de Deus (e também do coração de Maria) pudesse ser ouvido, ele estaria dizendo: eu te amo.
Por onde andam, pois, nossos passos que se recusam a seguir esse amor? Por onde se desvia nossa alma que procura outra coisa senão Deus e sua justiça através do Coração de Maria? Quem é o homem, que tipo de orgulho tem esse ser infame, para pensar, por um momento, que pode viver sem esse amor? Malditos sejam aqueles que não amam a Deus e que não o buscam de todo o coração, disse Santo Agostinho. De igual forma, malditos são os que não buscam Maria de todo o coração.
Logo os homens, esses seres tão desapercebidos, querem se impor a Deus. Logo o homem, tão pecador e ausente da Graça, decaído e humilhado. Quem pensa que é o homem para escolher viver sem Deus? Quem pensamos que somos ao deixarmos a Graça jorrar as bicas, por tantas vias diferentes, sem nos preocuparmos com nossa salvação? Pés corram, porque há muito tempo vocês têm procurado coisas vãs. Andem depressa para buscar a Deus, porque a hora já é adiantada e sua alma ainda não se consumiu pelo amor de Deus que, como fogo queima o papel, nos queima até nos aniquilar. Busquem a Salvação que jorra da Misericórdia de Deus, presente nas Graças distribuídas por Maria, antes que seja tarde e antes que seja envergonhado pelos seus pecados frente ao terrível juiz, ao qual nada escapa e que tudo lhe mostrará de sua vida no último dia. Nesse dia, será que estaremos preparados? Será que teremos amado o suficiente? Será que teremos feito a vontade de Deus?
Se soubéssemos quanto amor e quanta felicidade nos aguarda diríamos a todo instante: “Mãe, ensina-nos a ser nada para que Cristo seja tudo em nós”. Maria foi um nada, se auto chamou escrava de Deus e assim deixou Deus fluir através de seu coração, permitiu que Cristo fosse tudo nela. Sede em nosso favor Virgem Santíssima, dá-nos a santidade. Ensinai-nos Virgem Santíssima a sermos nada, a nos aniquilarmos, a nos dissolvermos nesse Infinito amor de Deus. Ensinai-nos a ser nada para que Cristo seja tudo em nós. Vem em nosso auxílio, oh Mãe, e apressa nossos passos para perto de Deus e para longe do pecado. Apressa nossos passos, oh Mãe, e nos leve até vosso Divino Filho, chagado pela Misericórdia, para que sejamos seus servos, seus mais fiéis vassalos.
Se pudéssemos compreender a bondade de Deus, se pudéssemos tocar sua misericórdia preferiríamos morrer de fome para ter sua Graça do que trabalhar pensando em ter o que comer. Entretanto, é vontade de Deus que vivamos para que mostremos ao mundo, com orações e exemplos, sua misericórdia e seu amor. É para ter mais servos de Deus que Ele nos permite viver. E quantas almas existem precisando da Misericórdia! Quantas pessoas teriam vivido ao invés de escolher a morte se tivessem conhecido esse amor! Deus nos oferece dois caminhos, o de segui-lo, tendo assim a vida, e o de abandoná-lo, tendo assim a morte. Devemos, pois, escolher a vida.
A escolha da vida nos faz automaticamente seguir o belo exemplo de servidão e de entrega total a Maria. Sejamos seus imitadores, porque ela foi a mais perfeita imitadora de Cristo. Não há outra forma, não existe outra via tão segura. Sejamos, pois, retos, mansos e humildes de coração. Não sigamos o pecado, porque o salário do pecado é a morte. Se não temos a força que é necessária, é bom evitarmos as situações de pecado. Que sejamos, pois, verdadeiros filhos de Deus.
Que nos deixemos nos consumir pelo infinito amor de Deus e que sejamos a cada dia mais fiéis e mais orantes. Que tenhamos o firme propósito de não mais pecar e que Maria nos dê o arrependimento perfeito, aquela compunção de Davi penitente. Que possamos nos extinguir, nos aniquilar na vontade de Deus, afinal, sem Deus aonde iremos? Só Deus tem palavras de vida eterna, a felicidade sem fim ao lado de nosso bem amado.

Salve Rainha, mãe de misericórdia, vida, doçura e esperança nossa salve! A vós bradamos os degredados filhos de Eva. A vós suspiramos gemendo e chorando nesse vale de lágrimas. Eia, pois, advogada nossa, esses vossos olhos misericordiosos a nós volvei. E depois desse desterro, mostrai-nos Jesus, o Bendito Fruto de Vosso Ventre. Ó clemente, ó piedosa, ó doce e sempre virgem Maria.
Rogai por nós, Santa Mãe de Deus.
Para que sejamos dignos das promessas de Cristo.
Amém